terça-feira, 16 de novembro de 2010

A Evolução do Ser Humano / Parte II (Antroposofia)




O COMEÇO DA EXISTÊNCIA TERRESTRE

Ao emergir do terceiro pralaya, o nosso sistema solar era uma formação anímico-espiritual homogênea.

Percorridos alguns estados não-físicos da matéria ele apareceu, inicialmente, sob a forma de calor, ao qual mais tarde se juntaram o elemento gasoso e o elemento líquido.

Mas, antes da formação deste último, verificou-se um fato de suma importância: não podendo participar dessa densificação progressiva, seres muito elevados da hierarquia dos espíritos da forma, ou Exusiai, afastaram-se do resto da massa gaseiforme e deram origem a um corpo separado: o Sol atual. Este era, pois, originalmente, a sede espiritual dos Exusiai, e sua "matéria" foi acrescentada mais tarde sem nunca atingir a densidade de nossa Terra.

Os Exusiai, que antes dessa separação tinham atuado de dentro da Terra, passaram a atuar agora apenas de fora. Daí resultaram estados alternados de influência maior ou menor, e que provocaram movimentos rotativos, origem de fenômenos comparáveis ao dia e à noite, e de estados de consciência mais ou menos clara (vigília e sono).

Após a separação, do Sol, o elemento líquido, e mais tarde também o sólido, manifestaram-se pela primeira vez, mas ainda numa forma extremamente fina: Se falarmos a seguir de "endurecimento" progressivo, devemos lembrar-nos de que a "dureza" dos objetos mais densos nem de longe atingia a de um cristal de hoje.

Esse endurecimento, fruto da atuação de outros seres espirituais, ia aumentando até chegar ao perigo muito concreto de que toda a vida se tornasse impossível aos entes humanos e aos outros, que tinham chegado da antiga Lua e que existiam na nova Terra desde o seu início. Diante desse perigo esses entes se retiraram da Terra formando, sob a tutela de espíritos mais elevados, novos corpos celestes: os planetas Marte, Júpiter e Saturno. Ao mesmo tempo, os planetas interiores foram formados por seres solares que não puderam acompanhar a evolução dos seus companheiros no Sol, separando-se deste. Todo o nosso sistema planetário teve, pois, uma origem espiritual.

Quando o perigo de petrificação da Terra estava no seu máximo, ameaçando para sempre a sua futura evolução, os entes divinos que vigiavam todo o desenvolvimento descrito frustraram esse perigo, deslocando os seres petrificadores para fora do próprio corpo da Terra onde formaram um novo corpo à parte: a nossa Lua, a partir da qual passaram a exercer sua influência endurecedora de maneira mais amena.

Os entes (precursores dos homens, etc.) que, ante a impossibilidade de permanecer na Terra, haviam emigrado para os outros planetas, começaram a regressar, pouco a pouco, na medida em que a Terra foi-se tornando novamente mais "mole", após a saída dos seres lunares.

Nessa volta progressiva chegaram primeiro aqueles que, sendo pouco evoluídos, podiam contentar-se com corpos físicos relativamente "duros" foram as plantas inferiores e superiores, seguidas, mais tarde, pelos animais, sempre na ordem do seu grau de desenvolvimento.

Os "homens" aos quais o mundo ainda não oferecia condições de vida adequada, permaneceram nos planetas e fizeram a sua aparição na Terra em último lugar.

Nesse ínterim, o elemento sólido havia se implantado progressivamente; estamos chegando às épocas das quais nos fala a paleontologia.

Convém por em relevo que a evolução, tal como a descreve a Antroposofia, corresponde inteiramente aos achados paleontológicos; camadas puramente minerais, sem vida nas formações mais antigas; traços de vida vegetal e animal nas camadas mais recentes ainda e, finalmente, depois de muitas formas transitórias, o homem.

Foi ele, o homem, pois, o ser que soube esperar mais tempo. Aqueles que voltaram antes não atingiram o estado humano, pois não puderam encarnar-se num corpo individualizado. Destes, os mais evoluídos eram os "Eus de grupo", que emprestaram cada qual sua individualidade a toda uma espécie de animais sobre a qual agiam "de fora" (leões, elefantes, etc.).

Vemos, pois, a interpretação dos fatos segundo a Antroposofia repousar, como a teoria de Darwin, sobre o aparecimento gradativo de formas cada vez mais perfeitas. Mas enquanto o darwinismo postula que o ser mais complicado "descende" de um ser terrestre mais simples, a Antroposofia mostra que, ao contrário, os seres mais avançados existiam desde o início - embora numa forma apenas espiritual - e que os seres mais simples se "encarnaram", aparecendo na Terra antes dos mais evoluídos, porque ela não oferecia ainda, a estes últimos, condições físicas adequadas. A verdadeira corrente evolucionista é a do homem. Todos os demais seres ficaram para trás.

Paralelamente à descida do homem, assistimos a um progresso na sua consciência.

Enquanto o corpo astral era a parte mais alta da entidade humana, vemos agora os primeiros germes do eu nela implantados, num progresso extremamente lento. A "substância" espiritual desses eus era como que uma emanação dos Exusiai, os espíritos solares que podem, portanto, ser considerados como "criadores" do homem, nesta Terra.

O grau de consciência desses eus era muito baixo.

Nem de longe tinham consciência de si próprios.

Viviam, por assim dizer, num estado de sonho onde ainda se sentiam "unos" com seus criadores e com os mundos espirituais, que percebiam mediante uma vivência supra-sensível generalizada.

Era um estado de perfeita harmonia, uma existência "na presença de Deus". Era o Paraíso da nossa Bíblia.

Nas ciências ocultas, dá-se a essa época o nome de "época lemúrica", pois a humanidade vivia principalmente numa região da nossa Terra (que ainda não possuía a sua configuração atual), situada a leste da África e atualmente coberta pelo Oceano Índico: o lendário continente da Lemúria (ou Gondwdnaland).

Esse período lemúrico (ao qual precederam dois outros períodos desde a formação física da Terra) foi muito longo: incluía a separação da Lua a volta progressiva dos seres emigrados e os acontecimentos que passaremos a expor.

Repetindo sua façanha da antiga Lua, um grande grupo de seres espirituais de todas as hierarquias se revoltaram contra a evolução traçada pela Providência (se nos é permitido chamar assim ao plano cósmico inspirado pelas mais altas hierarquias), procurando um desenvolvimento independente caracterizado por uma autonomia mais-ampla.

Essa revolução é conhecida nas várias mitologias e religiões como a "queda dos anjos".

Chamaremos esses seres de luciféricos, de acordo com o nome tradicional do seu inspirador e chefe.

Irradiando a sua influência e a sua sede de autonomia, esses seres luciféricos atingiram também o homem cujo eu ainda pouco desenvolvido foi arrebatado ao ambiente protegido das hierarquias humanas normais.

O ser humano caiu então sob a influência do seu corpo astral repleto de paixões e instintos pouco domados.

Em consequência disso, iniciou-se uma alienação progressiva do homem em relação ao seu ambiente.

Vivera até então na "presença de Deus", isto é, num estado onírico de comunhão com os mundos superiores.

Sob a influência luciférica nasceu-lhe uma consciência mais clara, e os sentidos físicos se lhe abriram na mesma medida em que a vidência superior cessava.

Enquanto até esse momento o seu ser estivera permeado pelas forças harmoniosas dos seres "bons", a separação provocou defeitos cada vez mais graves em toda a sua organização: o eu e o corpo astral tornaram-se fontes de cobiças e maus instintos, o corpo etérico passou a apresentar doenças e fraquezas, e a morte fez sua entrada na Terra, como necessidade de um descanso regenerador.

Do ponto de vista espiritual, o homem adquiriu a capacidade de agir em desacordo com as leis divinas, isto é, de pecar.

Na verdade, ele passou ao mesmo tempo a ser um ente responsável e moral, pois somente quem tem a possibilidade de pecar tem o mérito de não pecar.

No Paraíso, o homem era perfeito; mas era um ser sem autonomia, um autômato, sem qualquer mérito pela perfeição.

Afastado da sua origem divina, ele tornou-se exposto a todas as fraquezas, aos defeitos e ao pecado.

Mas em compensarão libertou-se dos velhos laços tornando-se dono das suas decisões, e adquirindo o livre arbítrio e a plena consciência de si; e com isso, a verdadeira dignidade humana, ou pelo menos a esperança de possuí-la um dia!

A evolução até agora esboçada estendeu-se naturalmente por muitos milênios.

Estamos ainda em meio a esse processo, que é o drama central da humanidade.

A imagem da queda do homem, do seu pecado original e da expulsão do paraíso, encontrou a sua expressão mais condigna nas frases lapidares do Velho Testamento (Gênesis, 2, 16 e ss.):

"Ordenou Deus Jeová ao homem: De toda árvore do jardim podes comer livremente, mas da árvore do conhecimento do Bem e do Mal, dela não comerás; porque no dia em que dela comeres, certamente morrerás".
- Sobrevém o "diabo", a serpente, isto é, o anjo caído (Gên. 3, A e ss.):
"Então a serpente disse à mulher:
Certamente não morrereis, porque Deus sabe que no dia em que comerdes do fruto, abrir-se-vos-ão os olhos, e sereis como Deus, conhecendo o Bem e o Mal".

E os homens sucumbiram a essa influência, com o resultado seguinte (Gênesis 3, 7):
"Foram abertos os olhos de ambos, e conhecendo que estavam nus, coseram folhas de figueira . . ."

Que imagem grandiosa para dizer que os sentidos físicos iam despertando e que os homens se tornavam conscientes de si, experimentando o sentimento de pudor!

E foram expulsos do Paraíso.

As imagens do Paraíso, da tentação, do pecado e da expulsão, encontramo-las em muitíssimos mitos e religiões; prova insofismável de que se trata de uma tradição arquétipa de toda a humanidade.

A tentação luciférica abriu caminho para um outro grupo de seres negativos, os chamados "espíritos arimânicos", dos quais falaremos mais tarde.

A sua influência nefasta se fez sentir em épocas posteriores, com o intuito de velar ao homem o conhecimento da sua verdadeira natureza espiritual.

Os seres arimânicos trouxeram o erro, a mentira, a morte e o isolamento, cada vez maior do homem em relação às suas origens divinas.

Seria ingênuo chamar as forças luciféricas e arimânicas de "más", e as outras de "boas", simplificando por demais a sua classificação.

Na realidade, sem a tentação e sem o pecado original, o homem não teria atingido seu pleno desenvolvimento.

Os seres "negativos" o afastaram do caminho original e o atraíram egoisticamente para as suas esferas.

Mas com isso fizeram nascer nele a consciência de si, o intelecto, o amor pela Terra e o livre arbítrio; tudo isso são qualidades sem as quais não podemos falar em homem, nem em dignidade humana.

Como consequência de sua queda, o homem pôde utilizar certas forças que dominava, graças ao seu antigo entrosamento nos mundos espirituais (podemos chamar essas forças de mágicas), em completo desacordo com esses mundos. Tais abusos, ditados pelo triunfo da sua astralidade ainda caótica e mal-intencionada, provocaram o fim da Lemúria; o continente desapareceu em meio a grandes catástrofes de fogo, resultado direto dos excessos mágicos dos homens lemúricos.

Um novo centro de vida humana formou-se, então, na Atlântida, velho continente, a oeste da Europa, do qual nos falaram Platão e outros autores antigos.

Apesar da expulsão do paraíso, os homens atlânticos ainda possuíam contatos muito mais íntimos com os mundos superiores, do que nós.

Sentindo em particular uma certa ligação com os planetas dos quais originalmente provieram, formaram centros de inspiração onde restabeleceram o contato com os entes inspiradores desses planetas.

Esses lugares, os chamados oráculos, eram verdadeiros centros iniciáticos onde os mais avançados entre os homens recebiam as suas inspirações.

Esses guias transmitiam as instruções dos deuses aos outros homens. Eram os chefes dos vários grupos sociais.

Na Atlântida formaram-se pouco a pouco as raças primitivas e as línguas, estas a partir de uma proto-língua única.

Devemos imaginar os homens atlânticos como ainda bem diferente de nós. Somente no fim da época atlântida, o seu aspecto exterior, tornou-se igual ao nosso.

Os seres humanos tinham ainda muitos poderes que seriam considerados hoje como supra-naturais. Podiam, por exemplo, modificar a sua forma e tamanho, de acordo com os sentimentos que os animavam.

Em comparação com o ser humano de hoje, sua consciência era muito mais nebulosa; sua inteligência, no sentido atual da palavra, era rudimentar.

Mas a evolução se fazia no sentido de um despertar cada vez maior do intelecto.

Vemos em muitas imagens de epopéias clássicas a vitória do homem fisicamente frágil, porém mais inteligente, sobre um adversário que representava as forças mágicas nebulosas e indisciplinadas do passado, como as histórias de Davi e Golias e de Ulisses e Polifemo. Os gigantes e dragões dos antigos mitos e fábulas ainda nos lembram aspectos de seres dessa espécie, transformados em imagens simbólicas.

Como na velha Lemúria, ocorreram na Atlântida abusos de forças mágicas, inicialmente reservadas aos iniciados dos oráculos.

Esses abusos produziram uma série de catástrofes aquáticas, que puseram fim à Altantida; ela afundou, deixando em seu lugar o oceano que traz seu nome.

Antes e depois dessa catástrofe, houve grandes migrações de grupos humanos, que se foram fixar nos vários pontos da Terra, formando as raças históricas.

Houve tais migrações com destino à América, à África, à Ásia oriental.

Os homens mais evoluídos emigraram em último lugar para a Ásia Central, sob a condução de um grande iniciado chamado Manu.

Esse nome está relacionado com o de Noé (Noah) da Bíblia, e, de fato, ambos são a mesma individualidade. Encontramos ainda a mesma raiz fonética em Manitu (grande espírito dos índios norte-americanos), no Manas dos hindus e no Maná (alimento dos israelitas após a fuga do Egito), e também em Menes e Minos, fundadores lendários das civilizações do Egito e de Creta, respectivamente.

Também a história do Dilúvio (pois o fim da Atlântida corresponde ao Dilúvio) faz parte de muitas religiões; coincide com as últimas épocas glaciais, e leva-nos quase ao limiar dos tempos históricos que se desenrolam no chamado período pós-atlântico.
Texto de R. Lanz

Fonte:
sociedade antroposófica brasileira