quinta-feira, 16 de junho de 2011

O mecanismo da consciência



Por que estamos imersos na inconsciência?

Por que é tão árduo e difícil acedermos à "consciência"?

Por que as energias e os impulsos instintivos e irracionais escapam ao nosso controle, nos condicionam e nos levam em direções erradas, causando-nos, assim, sofrimentos e conflitos?

Porque a "consciência" é uma conquista, é o fruto de um amadurecimento e de um lento e progressivo crescimento interior.

A evolução é a passagem da inconsciência para a consciência, e o reino humano é o local e o nível em que essa passagem se dá, graças ao processo de individuação que cria o eu. Até agora, examinamos o homem e a sua complexa constituição oculta mais em termos de "energia". De fato, dissemos que o ser humano pode ser considerado "um agregado de energias diversas". Devemos, agora, examinar também o aspecto de "consciência" presente no homem, aspecto talvez o mais difícil de se assimilar, por estar em contínuo desenvolvimento e mudança e, além disso, ter que ser experimentado para ser realmente compreendido.

O auge da consciência é, na realidade, no caso do homem, a "consciência de si", cuja conquista implica que seja despertado um centro estável, que represente o "ser" contraposto ao tornar-se, capaz de ser livre, consciente, autodeterminado, independentemente dos veículos pessoais. Portanto, enquanto não emergir em nós esse "centro", nunca saberemos o que é realmente a consciência.

Sri Aurobindo afirma que, na realidade, a evolução não é outra coisa senão uma lenta e gradual transformação da energia em consciência.

O que significam tais palavras?

Querem dizer que energia e consciência são a mesma coisa, mas que uma exprime o aspecto vital da realidade, e a outra o aspecto consciência, desperta pouco a pouco.

A energia é consciência em estado potencial.

No que diz respeito ao aspecto psicológico, porém, devemos cuidar não confundir aquilo que a psicanálise chama de "consciente" com a consciência. O consciente é a parte racional de nós mesmos, aquela que se opõe o irracional, isto é, ao inconsciente, enquanto a "consciência" é algo muito mais profundo, mais amplo e integral, pois surge da síntese de consciente e inconsciente, e nos permite reconhecer o verdadeiro eu, o nosso Si. É o verdadeiro conhecimento transformado em realização, assimilado e tornado uma parte de nós mesmos.

O consciente também é chamado de "campo de consciência", ou seja, aquela porção de consciência de que dispõe o eu racional em dado momento de fato, os conteúdos deste campo de consciência também podem variar conforme a direção e a focalização da atenção. É a atenção, na verdade, que nos torna conscientes de um determinado fato. Ela foi comparada a um feixe de luz que podemos orientar em qualquer direção, sendo tanto mais intensa quanto maior for sua concentração, podendo ser ainda circunscrita, tal como a luz de uma lâmpada aparada por um quebra-luz ilumina uma determinada área enquanto todo o resto permanece na penumbra.

1. Inconsciente inferior ou subconsciente.

2. Inconsciente médio ou pré-consciente.

3. Inconsciente superior ou Superconsciente.

4. Campo da consciência.

5. Eu consciente.

6. Eu Espiritual ou Si.

7. Inconsciente coletivo.

A área de penumbra foi chamada pela psicanálise de "pré-consciente", compreendendo todos os conteúdos da psique que podem entrar facilmente no campo da consciência se dirigirmos nossa atenção para eles. É preciso dizer também que, dependendo do grau evolutivo, do temperamento, dos interesses, etc. de um dado indivíduo, os conteúdos de seu consciente variam pela "qualidade", profundidade e grau de autenticidade. Com esta última palavra, queremos indicar o grau de concordância efetiva da consciência superficial com a consciência profunda e real. O esquema desenhado anteriormente, idealizado pelo Prof. Roberto Assagioli, eminente psicólogo, fundador da Psicosintese, pode nos ajudar a entender melhor a complexa estrutura de nossa psique, mesmo levando em consideração que todo esquema, por motivo de força maior, é sempre limitado.

A partir deste esquema, duas coisas tornam-se claras: primeiro, a subdivisão da nossa consciência em diferentes níveis, e a aparente presença de dois "eus", um deles localizado no centro do campo de consciência (5) e o outro no vértice do Superconsciente (6).

Quanto à subdivisão em diferentes níveis, a área indicada por 1 corresponde ao inconsciente inferior (subconsciente), representando o nosso passado, os nossos instintos atávicos, porém sempre ativos e vitais, exercendo uma profunda influência sobre o nosso comportamento e sobre a nossa maneira de ser; além disso, contém todas as experiências, eventos, sofrimentos e traumas que ficaram indelevelmente impressos no magma sensibilíssimo de nosso inconsciente, desde a primeiríssima infância.

É o inconsciente psicanalítico, aquele descoberto e estudado por Freud e pelos psicanalistas do primeiro período. O inconsciente médio representa o "presente", isto é, toda aquela parte da nossa psique (em todos os níveis, emocionais e mentais) que é atual mas de que não podemos ter completa consciência, seja por que a nossa atenção é restrita, seja por que não temos ainda a "continuidade de consciência", isto é, o conhecimento contemporâneo de todos os nossos veículos sutis.

O inconsciente superior, ou Superconsciente, representa em certo sentido o nosso futuro, isto é, as nossas mais altas faculdades, potencialidades e energias superiores que, latentes em nós, não podemos ainda manifestar, porque não nos achamos suficientemente maduros ainda.

O nosso Si vive e vibra nessa área mais alta de nossa consciência interior, sendo também "inconsciente" com relação à consciência comum, pois nós não temos consciência disso.

Quanto à aparente existência de dois "eus" em nossa consciência, devemos esclarecer que tal dualidade não existe. Trata-se de um fenômeno ilusório, criado pelo estado de carência e escuridão que nos faz identificar com aquilo que é instrumental e superficial, criando-nos uma falsa personalidade, um eu inautêntico, mecânico e condicionado, enquanto o verdadeiro eu representa uma abstração, algo de exterior, de vago, ainda a ser alcançado e definido.

Na realidade, não há dois "eus", mas um só.

O eu consciente (5) não é o Eu real, mas a parte dele que se filtra em nosso conhecimento ordinário e, em razão disso, se altera, se distorce e, de certa maneira, se disfarça. O significado do eu, a autoconsciência, ainda que distorcida e limitada dessa forma, é sempre, porém, um fruto da verdadeira consciência, já que nunca deixa de ser um reflexo dela.

Poderíamos dizer que o eu consciente é a semente do Eu verdadeiro que, encerrado na matriz, adormecido, aprisionado na escuridão, abriga não obstante uma vida, e mesmo limitando-a, a nutre e protege. Tudo o que existe em nós, mesmo no nível inferior, partilha da natureza divina do Si, mas esse liame nós o perdemos na inconsciência, cabendo a nós, portanto, reencontrar esse nexo associativo tanto quanto a relação que nos permita reconstruir a unidade.

A psicanálise também afirma que não temos consciência de determinadas áreas de nossa psique, pois falta "a associação", a relação. A partir daí, surgiu o método chamado "livre associação" ou "palavras-estímulo", que serve para criar uma ponte com as lembranças sepultadas e com as experiências submersas, fazendo com que aflorem à consciência.

Quanto ao Superconsciente, ocorre o mesmo: falta a ponte, que deveríamos construir com métodos semelhantes aos das "associações" e das "palavras-estímulo", o que de fato se consegue através da meditação com semente ou da técnica das mantras... Entretanto, não posso entrar agora em maiores detalhes sobre este assunto, mesmo que seja muito interessante e importante.

Vejamos, ao invés disso, o que pode haver de útil para o estudo das doenças e dos distúrbios psicossomáticos.

Que inconvenientes nos podem advir do estado de inconsciência e de cisão?

Tais inconvenientes podem ser infinitos, como podemos verificar a cada momento de nossa vida.

Erros, ilusões, escolhas erradas, atitudes negativas, aridez, egoísmo etc, com todas as conseqüências previsíveis, acarretando infelicidade, angústia, depressão e inúmeros sofrimentos e dificuldades, tanto no plano psíquico como no plano físico, sob a forma de doenças.

Já examinamos, ainda que superficialmente, alguns destes inconvenientes ao falarmos das doenças causadas pela congestão e a inibição, devidas justamente a uma utilização errada das energias, provocadas exatamente pelo nosso estado de inconsciência e escuridão.

Mas o que é mais grave é que não estamos fechados somente aos impulsos e às energias que provêm do inconsciente inferior e do inconsciente médio, mas também aos impulsos do inconsciente superior, do Superconsciente e, portanto, do nosso Si.

Vivemos separados, apartados da nossa verdadeira essência, do centro de nosso ser, que é harmonia, alegria, consciência total, e não o sabemos, pelo contrário, que há em nós um estado de "oposição", quase de hostilidade e rebelião inconsciente em relação à voz silenciosa do nosso verdadeiro Eu.

É uma forma de "resistência", semelhante à que se verifica nas neuroses comuns, ao subconsciente, constituindo o obstáculo mais grave para a cura. É uma espécie de dique defensivo que se opõe à análise, à tomada de consciência dos traumas sepultados, dos impulsos profundos.

A personalidade consciente se defende, pois criou para si um refúgio na doença, tem medo de "crescer", de amadurecer e sofrer, e esta resistência mantém o indivíduo num estado de imaturidade, num estado de apego a níveis que deveriam ter sido superados e ultrapassados. E isso, justamente, porque o homem foge ao esforço, à fadiga de se superar, que ele interpreta como renúncia.

Diz Jung que "a inércia é o estado fundamental do homem". E, de fato, parece que assim é. Todavia, isso acontece sobretudo quando a consciência se identifica com o corpo físico, porque o principal atributo da matéria física é justamente a inércia (tamas), que se revela também como faculdade de "guardar", de "julgar" o que recebeu em si, exatamente como a terra acolhe a semente atirada ao seu seio.

Portanto, quando queremos evoluir e ultrapassar um determinado nível, devemos sempre agir de par com a vontade, e lutar contra a sua força de inércia inata, que tende à estaticidade e à imobilidade.

É preciso esforço e vontade, no início, para superar esta resistência que se apresenta também ao impulso evolutivo do Espírito, cuja tendência é sempre a de subir, progredir, ir de um estágio para o outro incessantemente.

Somos nós mesmos que, sem o saber, atraímos os males e sofrimentos, pois queremos nos separar daquilo que conquistamos e assim nos fechamos à luz.

Mas como proceder, se não temos consciência dessa luta que se trava em todos os níveis da consciência?

Mesmo quando não nos damos conta, devemos sempre levar em consideração que a nossa consciência é limitada, que não estamos completamente acordados, logo não devemos nos precipitar nos nossos atos, escolhas, opiniões e julgamentos... "O primeiro passo é nos dar conta de que não temos consciência disso...", diz Ouspensky, em seu livro O quarto caminho. E é isso mesmo, pois ao perceber que vivemos na inconsciência, começamos a sentir a necessidade de adquirir maior consciência, de "despertar", e lutar para sair da escuridão e da neblina.

Devemos nos tornar aquilo que somos na realidade, portanto não se trata de criar algo de novo, mas de nos "reencontrarmos", de "lembrarmos" quem somos, de despertarmos, para o que devemos primeiramente aprender a "nos ver", aceitar-mo-nos como somos, incluindo os nossos aspectos negativos, que frequentemente negamos, pois temos medo e repulsa de certos defeitos, de certas fraquezas.

Todavia, não é pela negação que iremos superar e anular as negatividades e os seus efeitos cármicos, e sim trazendo-os à luz da consciência, aceitando-os, para transformá-los em seguida em energia pura e canalizá-los na direção certa.

É preciso levar sempre em consideração que não se pode "reprimir", na tentativa de destruí-lo, o assim chamado mal, pois nada, efetivamente, pode ser destruído, já que tudo é energia viva e dinâmica.

O mal consiste na utilização incorreta, egoísta e exclusivista que fazemos das nossas funções, faculdades e energias, em razão do nosso estado de inconsciência e de identificação com a forma ilusória, portanto o remédio não está em sufocar, em inibir, mas em tomar corajosamente consciência de todos os nossos aspectos, através de uma paciente obra de auto-análise, para chegarmos em seguida à auto-realização e à harmonia, bases para a perfeita serenidade, para o completo equilíbrio e, consequentemente, também para a saúde física e psíquica.


Fonte:
Angela La Sala Bata
Medicina Psico Espiritual
Capítulo V