quarta-feira, 30 de julho de 2014
Bem que você poderia me amar
BEM QUE VOCÊ PODERIA ME AMAR
Você pode amar para esquecer quem foi um dia.
Você pode amar para lembrar quem foi um dia.
Você pode amar para recuperar a infância.
Você pode amar para repetir a adolescência.
Você pode amar para combater a velhice.
Você pode amar de olhos abertos, enxergando as falhas.
Você pode amar de olhos fechados, relevando os foras.
Você pode amar para se endividar.
Você pode amar para criar patrimônio.
Você pode amar para encontrar equilíbrio.
Você pode amar para se aproximar do abismo.
Você pode amar para ganhar lucidez.
Você pode amar para enlouquecer.
Você pode amar para adoecer de ciúme.
Você pode amar para ter segurança.
Você pode amar pessimista, falando mal aos seus amigos.
Você pode amar com esperança, silenciando os atritos.
Você pode amar magoado.
Você pode amar leve e desembaraçado.
Você pode amar para romper o padrão de antigos amores e aceitar que estava errado.
Você pode amar para imitar outros amores e se convencer de que estava certo.
Você pode amar fraquejando e acreditando nas próprias mentiras.
Você pode amar dizendo unicamente a verdade e suportando as crises da franqueza.
Você pode amar para confirmar expectativas.
Você pode amar para contrariar sua idealização.
Você pode amar para converter bandidos em santos.
Você pode amar para fazer santos pecarem.
Você pode amar à primeira vista.
Você pode amar por repescagem.
Você pode amar desconfiando e questionando as evidências.
Você pode amar por clarividência.
Você pode amar para ser triste e se deprimir de canções e livros.
Você pode amar para alegrar as estantes e os ouvidos.
Você pode amar para concordar com o terapeuta.
Você pode amar para se opor ao terapeuta.
Você pode amar para fugir da família.
Você pode amar para unir a família.
Você pode amar superficialmente, escondendo o que pensa.
Você pode amar profundamente, sem segredos e âncora para se fixar nas palavras.
Você pode amar pelo sexo.
Você pode amar pelo romance.
Você pode amar pela exposição.
Você pode amar pela solidão a dois.
Você pode amar os intermináveis problemas e brigas.
Você pode amar a paz que vem com o fim da noite.
Você pode amar compreendendo e rindo dos defeitos.
Você pode amar julgando e condenando as diferenças.
Você pode amar cuidando das roupas, da comida, da casa.
Você pode amar com a arruaça das ruas e da boemia.
Mas amor mesmo é quando você está contando seus dias, com toda a concentração dos números, e alguém chega para lhe atrapalhar de eternidade. E você esquece onde estava, a soma da sua vida, e só pensa em ficar para sempre do jeito que for. Ainda que seja por um dia.
Fabrício Carpinejar
Publicado no jornal Zero Hora
Revista Donna, p.6
Porto Alegre (RS), 27/7/2014
Edição N° 17872
domingo, 27 de julho de 2014
...arte para mim...
"Arte para mim não é produto de mercado.
Podem me chamar de romântico.
Arte para mim é missão, vocação e festa."
Ariano Suassuna
quinta-feira, 24 de julho de 2014
Porque existem o Mal e o Sofrimento Humano?
Por que Existem o Mal e o Sofrimento Humano?
Por Leandro Gomes de Barros
" Se eu conversasse com Deus
Iria lhe perguntar:
Por que é que sofremos tanto
Quando se chega pra cá?
Perguntaria também
Como é que ele é feito
Que não dorme, que não come
E assim vive satisfeito.
Por que é que ele não fez
A gente do mesmo jeito?
Por que existem uns felizes
E outros que sofrem tanto?
Nascemos do mesmo jeito,
Vivemos no mesmo canto.
Quem foi temperar o choro
E acabou salgando o pranto?"
Sobre o autor:
Leandro Gomes de Barros nasceu no sítio Melancia, município de Pombal (PB), em 19 de novembro de 1865,morrendo em Recife (PE), em 4 de março de 1918. Foi o primeiro a escrever e editar histórias versadas em folhetos. Até os 15 anos viveu em Teixeira, centro de poesia popular.
Mudou-se em 1880 para Pernambuco, tendo vivido em Vitória de Santo Antão, Jaboatão e Recife. Começou a escrever em 1889 e, sobrevivendo de folhetos, sustentou uma numerosa família. Casado com dona Venustiniana Eulália de Souza, teve vários filhos. Uma, de nome Raquel, que casou com o poeta Pedro Batista, assumiu por uns tempos a administração da obra do pai, depois de falecido. Pelo que foi possível apurar, Leandro não deixou descendentes poéticos diretos. Em Teixeira, Leandro conviveu com grandes violeiros, a exemplo de lnácio da Catingueira, Romano da Mãe d'Água, Bernardo Nogueira e Ugulino Nunes da Costa. Por eles nutriu grande simpatia e admiração e deles herdou o estro da poesia popular, tornando-se o primeiro sem segundo, escrevendo mais de seiscentas histórias, distribuídas em mais de 10 mil edições. A cidade de Pombal sempre foi grata a Leandro, reconhecendo seu talento e o poder de sua poesia matuta, que encantou e encanta, ainda hoje, os sertões nordestinos.
O que disseram de Leandro
Viveu exclusivamente de escrever versos populares, inventando desafios entre cantadores, arquitetando romances, narrando as aventuras de Antônio Silvino, comentando fatos, fazendo as tiras. Fecundo e sempre novo, original e espirituoso, é o responsável por 80% da glória dos cantadores atuais. Publicou cerca de mil folhetos, tirando deles mais de dez mil edições. Esse inesgotável manancial correu ininterrupto enquanto Leandro viveu. É ainda o mais lido dos escritores populares. Escreveu para sertanejos e matutos, cantadores, cangaceiros, almocreves, comboieiros, feirantes e vaqueiros. É lido nas feiras, nas fazendas, sob as oiticicas nas horas do 'rancho', no oitão das casas pobres, soletrado com amor e admirado com fanatismo.
Seus romances, histórias românticas em versos, são decoradas pelos cantadores. Assim, Alonso e Marina, O Boi Misterioso, João da Cruz, Rosa e Lino de Alencar, O Príncipe e a Fada, O Satírico Cancão de Fogo, Espécie de Palavras Cínicas, de Forjaz de Sampaio, A Órfã Abandonada etc, constituem literatura indispensável para os olhos sertanejos do Nordeste. Não sei se ele chegou a medir-se com algum cantador. Conheci-o na capital paraibana. Baixo, grosso, de olhos claros, o bigodão espesso, cabeça redonda, meio corcovado, risonho, contador de anedotas, tendo a fala cantada e lenta do nortista, parecia mais fazendeiro que um poeta, pleno de alegria, de graça e de oportunidade.
Quando a desgraça quer vir não manda avisar ninguém, não quer saber se um vai mal e nem se outro vai bem, e não procura saber que idade fulano tem. Não especula se é branco, se é preto, rico, ou se é pobre, se é de origem de escravo ou se é de linhagem nobre' É como o sol quando nasce. O que acha na terra, cobre! Um dia, quando se fizer a colheita do folclore poético, reaparecerá o humilde Leandro Gomes de Barros, vivendo ele fazer versos, espalhando uma onda sonora ele entusiasmo e de alacridade na face triste do sertão.
Fonte: http://www.algosobre.com.br/biografias/leandro-gomes-de-barros.html
domingo, 20 de julho de 2014
Feliz Dia do Amigo!
Historinha de amor prá gente grande
Contam os anjos que às vezes me inspiram que um pouquinho antes de materializar o seu plano de criação da vida humana e se derramar no coração de todas as coisas da Terra, o Senhor Deus Todo Poderoso resolveu repassá-lo, ponto a ponto, pela última vez. E, ao terminar o trabalho, sentiu, bastante surpreso, que ainda parecia estar faltando um detalhe sem nome nem rosto em sua grandiosa obra. Algo que não havia sido contemplado por nenhum dos incontáveis milagres com os quais dotaria o homem e o ambiente que preparava para acolhê-lo e supri-lo em sua jornada evolutiva.
Como um poeta que ao findar um poema é tocado pela vibração de uma palavra que não foi dita sem conseguir visualizar-lhe as feições, o Senhor Deus intuiu a ausência de uma dádiva no buquê de luzes que ofertaria ao homem para perfumar sua caminhada heróica, que trilharia até tornar-se um mestre das coisas que não passam e reunir-se a Ele numa só consciência criadora.
O Senhor Deus não sabia que doçura era aquela que reclamava sua amorosa atenção, mas pressentia que se tratava de algo imprescindível. De alguma graça que deixaria uma lacuna em branco em cada história humana, caso não existisse. De mais um dos presentes que bordaria em cada vida com os fios da delicadeza que utilizaria em tudo o que planejava ser forte. Mas o que poderia ser, Ele se perguntava, além das outras tantas ternuras que já havia previsto bordar?
E o Senhor Deus pensou, pensou, pensou. Relembrou cada detalhe, cada etapa, cada riqueza, pacientemente, com todo o zelo de seu coração criador. Reuniu-se com os mestres que o assessoravam no Plano. Trocou idéias. Ouviu, atento, as sugestões e observações que surgiram. Mas nada do que pensava e ouvia atendia à sua expectativa e se aproximava da resposta que buscava desde que aquela intuição lhe visitara. Que traço, afinal, poderia ainda criar para compor o conjunto das bençãos que desenharia na Terra? Que beleza era aquela que murmurava em seu ouvido sem revelar-lhe o rosto?
Contam que, como era costumeiro, numa certa manhã o Senhor Deus Todo Poderoso estava distraído no jardim de sua casa, cuidando amorosamente de suas plantas, quando um anjo, muito belo, muito jovem, banhado de luz azul, aproximou-se Dele para transmitir-lhe uma mensagem de um de seus arcanjos, Miguel, o príncipe celeste que comandava seu exército de luz. E que foi no exato instante em que olhou para aquele anjo que o Senhor Deus descobriu o que ainda faltava em seu plano: anjos que o homem pudesse ver, exatamente como Ele podia ver aquele.
O plano do Senhor Deus previa que seria escolhido para cada pessoa, a partir do momento alquímico de sua concepção, um anjo que iria acompanhá-la em toda a sua trajetória humana, até que devolvesse à Terra a roupa de carne que lhe havia sido emprestada. E, embora se tratasse de um leal companheiro, que iria fortalecê-la, protegê-la e inspirar-lhe, e lhe fosse possível falar com ele e ouvi-lo, em seu coração, o ser humano não poderia vê-lo, a não ser que em algum instante experimentasse um amor tão intenso que conseguisse penetrar na freqüência luminosa onde os anjos moram.
Como um poeta que ao findar um poema é tocado pela vibração de uma palavra que não foi dita sem conseguir visualizar-lhe as feições, o Senhor Deus intuiu a ausência de uma dádiva no buquê de luzes que ofertaria ao homem para perfumar sua caminhada heróica, que trilharia até tornar-se um mestre das coisas que não passam e reunir-se a Ele numa só consciência criadora.
O Senhor Deus não sabia que doçura era aquela que reclamava sua amorosa atenção, mas pressentia que se tratava de algo imprescindível. De alguma graça que deixaria uma lacuna em branco em cada história humana, caso não existisse. De mais um dos presentes que bordaria em cada vida com os fios da delicadeza que utilizaria em tudo o que planejava ser forte. Mas o que poderia ser, Ele se perguntava, além das outras tantas ternuras que já havia previsto bordar?
E o Senhor Deus pensou, pensou, pensou. Relembrou cada detalhe, cada etapa, cada riqueza, pacientemente, com todo o zelo de seu coração criador. Reuniu-se com os mestres que o assessoravam no Plano. Trocou idéias. Ouviu, atento, as sugestões e observações que surgiram. Mas nada do que pensava e ouvia atendia à sua expectativa e se aproximava da resposta que buscava desde que aquela intuição lhe visitara. Que traço, afinal, poderia ainda criar para compor o conjunto das bençãos que desenharia na Terra? Que beleza era aquela que murmurava em seu ouvido sem revelar-lhe o rosto?
Contam que, como era costumeiro, numa certa manhã o Senhor Deus Todo Poderoso estava distraído no jardim de sua casa, cuidando amorosamente de suas plantas, quando um anjo, muito belo, muito jovem, banhado de luz azul, aproximou-se Dele para transmitir-lhe uma mensagem de um de seus arcanjos, Miguel, o príncipe celeste que comandava seu exército de luz. E que foi no exato instante em que olhou para aquele anjo que o Senhor Deus descobriu o que ainda faltava em seu plano: anjos que o homem pudesse ver, exatamente como Ele podia ver aquele.
O plano do Senhor Deus previa que seria escolhido para cada pessoa, a partir do momento alquímico de sua concepção, um anjo que iria acompanhá-la em toda a sua trajetória humana, até que devolvesse à Terra a roupa de carne que lhe havia sido emprestada. E, embora se tratasse de um leal companheiro, que iria fortalecê-la, protegê-la e inspirar-lhe, e lhe fosse possível falar com ele e ouvi-lo, em seu coração, o ser humano não poderia vê-lo, a não ser que em algum instante experimentasse um amor tão intenso que conseguisse penetrar na freqüência luminosa onde os anjos moram.
Para o homem, pensava o Senhor Deus, por mais grandiosa que fosse, aquela dádiva não bastaria. Ele sabia que o ser humano teria dificuldade para lidar com as coisas que chamaria de invisíveis. Que se atrapalharia com tudo o que não pudesse ser tocado com algum dos cinco sentidos que, equivocadamente, acreditaria serem os únicos que possuía.
O homem precisaria também de anjos que fossem visíveis. Feitos da mesma matéria que ele. Com os quais pudesse brincar com os brinquedos humanos. Crescer junto, aprendendo, ensinando, trocando. Que os olhassem nos olhos e o encorajassem ao próximo passo às vezes sem uma única palavra sequer. Com os quais pudesse compartilhar os sabores, os sons, as visões, as falas e as texturas das coisas da Terra e sonhar com as coisas do céu. Que estivessem ao seu lado nos dias de sol e também lhe estendessem a mão para atravessar com ele o tempo em que as noites se fariam tão escuras que ele começaria a duvidar do amanhecer.
Sim, continuava a pensar o Senhor Deus, o homem precisaria de anjos visíveis que tivessem em sua vida a mesma bela tarefa do anjo que não podia ver. Anjos que permanecessem em seu caminho quando tudo parecesse ter ido embora. Que acreditassem nele até quando ele próprio se esquecesse quem era. Que quando o cansaço lhe visitasse e os apelos da sombra o convidassem a desistir, desembainhassem a própria espada para lembrar-lhe de que era também um guerreiro. Que emanassem para ele um bem-querer tão puro que fosse capaz de perfumar até o que ainda lhe doesse. Com os quais pudesse rir e chorar, e, sobretudo, ter a liberdade de ser.
O homem precisaria, sim, de anjos visíveis com sangue nas veias. Que tivessem dor de barriga, mau humor, contas pra pagar, unha encravada, medo, dente de siso para extrair, angústia, raiva, baixo astral, e toda uma séria de chatices humanas que os anjos invisíveis respeitam, mas não experimentam. Com os quais pudesse jogar conversa fora. Torcer por um time. Cantar desafinado. Caminhar na praia. Trocar um abraço. Empanturrar-se de risada e bobó de camarão num domingo grande. Que espelhassem para ele sua porção humana e sua porção divina e lhes fizessem parceria no contínuo exercício de integrá-las durante a viagem. Que pudessem servir de canais para os toques, os puxões de orelha e os carinhos do seu próprio anjo guardião, que, sem fazer ruído algum, trabalharia em sintonia com eles o tempo todo.
O homem precisaria também de anjos que fossem visíveis. Feitos da mesma matéria que ele. Com os quais pudesse brincar com os brinquedos humanos. Crescer junto, aprendendo, ensinando, trocando. Que os olhassem nos olhos e o encorajassem ao próximo passo às vezes sem uma única palavra sequer. Com os quais pudesse compartilhar os sabores, os sons, as visões, as falas e as texturas das coisas da Terra e sonhar com as coisas do céu. Que estivessem ao seu lado nos dias de sol e também lhe estendessem a mão para atravessar com ele o tempo em que as noites se fariam tão escuras que ele começaria a duvidar do amanhecer.
Sim, continuava a pensar o Senhor Deus, o homem precisaria de anjos visíveis que tivessem em sua vida a mesma bela tarefa do anjo que não podia ver. Anjos que permanecessem em seu caminho quando tudo parecesse ter ido embora. Que acreditassem nele até quando ele próprio se esquecesse quem era. Que quando o cansaço lhe visitasse e os apelos da sombra o convidassem a desistir, desembainhassem a própria espada para lembrar-lhe de que era também um guerreiro. Que emanassem para ele um bem-querer tão puro que fosse capaz de perfumar até o que ainda lhe doesse. Com os quais pudesse rir e chorar, e, sobretudo, ter a liberdade de ser.
O homem precisaria, sim, de anjos visíveis com sangue nas veias. Que tivessem dor de barriga, mau humor, contas pra pagar, unha encravada, medo, dente de siso para extrair, angústia, raiva, baixo astral, e toda uma séria de chatices humanas que os anjos invisíveis respeitam, mas não experimentam. Com os quais pudesse jogar conversa fora. Torcer por um time. Cantar desafinado. Caminhar na praia. Trocar um abraço. Empanturrar-se de risada e bobó de camarão num domingo grande. Que espelhassem para ele sua porção humana e sua porção divina e lhes fizessem parceria no contínuo exercício de integrá-las durante a viagem. Que pudessem servir de canais para os toques, os puxões de orelha e os carinhos do seu próprio anjo guardião, que, sem fazer ruído algum, trabalharia em sintonia com eles o tempo todo.
E depois de dividir com aquele anjo inspirador as feições de sua descoberta, contam que o Senhor Deus Todo Poderoso lhe perguntou o seu nome, pois seria com ele que, em gratidão, chamaria o anjo visível que cada pessoa encontraria na Terra.
E o anjo que inspirou o Senhor Deus, maravilhado com sua bondade, revelou-lhe o seu nome:
- Amigo.
E o anjo que inspirou o Senhor Deus, maravilhado com sua bondade, revelou-lhe o seu nome:
- Amigo.
Por Ana Jácomo
Esse texto foi publicado no livro "Parto de Mim", lançado em 2001.
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