segunda-feira, 4 de janeiro de 2016

Carta do Cacique Seattle de 1855.





Em 1855, o cacique Seattle, da tribo Suquamish, do Estado de Washington, enviou esta carta ao presidente dos Estados Unidos (Francis Pierce), depois de o Governo haver dado a entender que pretendia comprar o território ocupado por aqueles índios. Faz mais de um século e meio. Mas o desabafo do cacique tem uma incrível atualidade. Segue a carta:


“O grande chefe de Washington mandou dizer que quer comprar a nossa terra. O grande chefe assegurou-nos também da sua amizade e benevolência. Isto é gentil de sua parte, pois sabemos que ele não necessita da nossa amizade.

Nós vamos pensar na sua oferta, pois sabemos que se não o fizermos, o homem branco virá com armas e tomará a nossa terra. O grande chefe de Washington pode acreditar no que o chefe Seattle diz com a mesma certeza com que nossos irmãos brancos podem confiar na mudança das estações do ano.

Minha palavra é como as estrelas, elas não empalidecem. Como pode-se comprar ou vender o céu, o calor da terra? Tal idéia é estranha. Nós não somos donos da pureza do ar ou do brilho da água. Como pode então comprá-los de nós? Decidimos apenas sobre as coisas do nosso tempo.

Toda esta terra é sagrada para o meu povo. Cada folha reluzente, todas as praias de areia, cada véu de neblina nas florestas escuras, cada clareira e todos os insetos a zumbir são sagrados nas tradições e na crença do meu povo.

Sabemos que o homem branco não compreende o nosso modo de viver.

Para ele um torrão de terra é igual ao outro. Porque ele é um estranho, que vem de noite e rouba da terra tudo quanto necessita. A terra não é sua irmã, nem sua amiga, e depois de exaurí-la ele vai embora. Deixa para trás o túmulo de seu pai sem remorsos.

Rouba a terra de seus filhos, nada respeita. Esquece os antepassados e os direitos dos filhos. Sua ganância empobrece a terra e deixa atrás de si os desertos. Suas cidades são um tormento para os olhos do homem vermelho, mas talvez seja assim por ser o homem vermelho um selvagem que nada compreende.

Não se pode encontrar paz nas cidades do homem branco. Nem lugar onde se possa ouvir o desabrochar da folhagem na primavera ou o zunir das asas dos insetos. Talvez por ser um selvagem que nada entende, o barulho das cidades é terrível para os meus ouvidos.

E que espécie de vida é aquela em que o homem não pode ouvir a voz do corvo noturno ou a conversa dos sapos no brejo à noite? Um índio prefere o suave sussurro do vento sobre o espelho d’água e o próprio cheiro do vento, purificado pela chuva do meio-dia e com aroma de pinho.

O ar é precioso para o homem vermelho, porque todos os seres vivos respiram o mesmo ar, animais, árvores, homens. Não parece que o homem branco se importe com o ar que respira. Como um moribundo, ele é insensível ao mau cheiro.

Se eu me decidir a aceitar, imporei uma condição: o homem branco deve tratar os animais como se fossem seus irmãos. Sou um selvagem e não compreendo que possa ser de outra forma. Vi milhares de bisões apodrecendo nas pradarias abandonados pelo homem branco que os abatia a tiros disparados do trem.

Sou um selvagem e não compreendo como um fumegante cavalo de ferro possa ser mais valioso que um bisão, que nós, peles vermelhas matamos apenas para sustentar a nossa própria vida. O que é o homem sem os animais? Se todos os animais acabassem os homens morreriam de solidão espiritual, porque tudo quanto acontece aos animais pode também afetar os homens. Tudo quanto fere a terra, fere também os filhos da terra.

Os nossos filhos viram os pais humilhados na derrota. Os nossos guerreiros sucumbem sob o peso da vergonha. E depois da derrota passam o tempo em ócio e envenenam seu corpo com alimentos adocicados e bebidas ardentes. Não tem grande importância onde passaremos os nossos últimos dias. Eles não são muitos.

Mais algumas horas ou até mesmo alguns invernos e nenhum dos filhos das grandes tribos que viveram nestas terras ou que tem vagueado em pequenos bandos pelos bosques, sobrará para chorar, sobre os túmulos, um povo que um dia foi tão poderoso e cheio de confiança como o nosso.

De uma coisa sabemos, que o homem branco talvez venha a um dia descobrir: o nosso Deus é o mesmo Deus. Julga, talvez, que pode ser dono Dele da mesma maneira como deseja possuir a nossa terra. Mas não pode. Ele é Deus de todos. E quer bem da mesma maneira ao homem vermelho como ao branco.

A terra é amada por Ele. Causar dano à terra é demonstrar desprezo pelo Criador. O homem branco também vai desaparecer, talvez mais depressa do que as outras raças. Continua sujando a sua própria cama e há de morrer, uma noite, sufocado nos seus próprios dejetos.

Depois de abatido o último bisão e domados todos os cavalos selvagens, quando as matas misteriosas federem à gente, quando as colinas escarpadas se encherem de fios que falam, onde ficarão então os sertões? Terão acabado. E as águias? Terão ido embora.

Restará dar adeus à andorinha da torre e à caça; o fim da vida e o começo pela luta pela sobrevivência. Talvez compreendêssemos com que sonha o homem branco se soubéssemos quais as esperanças transmite a seus filhos nas longas noites de inverno, quais visões do futuro oferecem para que possam ser formados os desejos do dia de amanhã.

Mas nós somos selvagens. Os sonhos do homem branco são ocultos para nós. E por serem ocultos temos que escolher o nosso próprio caminho. Se consentirmos na venda é para garantir as reservas que nos prometeste. Lá talvez possamos viver os nossos últimos dias como desejamos.

Depois que o último homem vermelho tiver partido e a sua lembrança não passar da sombra de uma nuvem a pairar acima das pradarias, a alma do meu povo continuará a viver nestas florestas e praias, porque nós as amamos como um recém-nascido ama o bater do coração de sua mãe.

Se te vendermos a nossa terra, ama-a como nós a amávamos. Protege-a como nós a protegíamos. Nunca esqueça como era a terra quando dela tomou posse. E com toda a sua força, o seu poder, e todo o seu coração, conserva-a para os seus filhos, e ama-a como Deus nos ama a todos.

Uma coisa sabemos: o nosso Deus é o mesmo Deus. Esta terra é querida por Ele. Nem mesmo o homem branco pode evitar o nosso destino comum.”


Letter From Chief Seattle to President Pierce, 1885


In 1851 the Suquamish and other Indian tribes around Washington's Puget Sound were faced with a proposed treaty which in part persuaded them to sell two million acres of land for $150,000. Chief Seattle of the Suquamish tribe was a very spiritual and articulate man. If he gave a speech on that occasion, it might well have sounded like this:


How can you buy or sell the sky, the warmth of the land? The idea is strange to us. If we do not own the freshness of the air and sparkle of the water, how can you buy them?


Every part of this earth is sacred to my people.


Every shining pine needle, every sandy shore, every mist in the dark woods, every clearing and humming insect is holy in the memory and experience of my people. The sap which courses through the trees carries the memories of the red man.


The white man's dead forget the countryof their birth when they go to walk among the stars. Our dead never forget this beautiful earth, for it is the mother of the red man.


We are part of the earth and it is part of us.


The perfumed flowers are our sisters; the deer, the horse, the great eagle, these are our brothers.


The rocky crests, the juices in the meadows, the body heat of the pony, and man--all belong to the same family.


So, when the Great Chief in Washington sends word that he wishes to buy land, he asks much of us. The Great Chief sends word he will reserve us a place so that we can live comfortably to ourselves.


He will be our father and we will be his children. So we will consider your offer to buy our land.


But it will not be easy. For this land is sacred to us.


This shining water that moves in the streams and rivers is not just water but the blood of our ancestors.


If we sell you land, you must remember that it is sacred, and you must teach your children that it is sacred and that each ghostly reflection in the clear water of the lakes tells of events and memories in the life of my people.


The water's murmur is the voice of my father's father.


The rivers are our brothers, they quench our thirst. The rivers carry our canoes, and feed our children. If we sell you our land, you must remember, and teach your children, that the rivers are our brothers, and yours, and you must henceforth give the rivers the kindness you would give any brother.


We know that the white man does not understand our ways. One portion of land is the same to him as the next, for he is a stranger who comes in the night and takes from the land whatever he needs.


The earth is not his brother, but his enemy, and when he has conquered it, he moves on.


He leaves his father's graves behind, and he does not care.


He kidnaps the earth from his children, and he does not care.


His father's grave, and his children's birthright, are forgotten. He treats his mother, the earth, and his brother, the sky, as things to be bought, plundered, sold like sheep or bright beads.


His appetite will devour the earth and leave behind only a desert.


I do not know. Our ways are different from your ways.


The sight of your cities pains the eyes of the red man. But perhaps it is because the red man is a savage and does not understand.


There is no quiet place in the white man's cities. No place to hear the unfurling of leaves in spring, or the rustle of an insect's wings.


But perhaps it isbecause I am a savage and do not understand.


The clatter onlyseems to insult the ears. And what is there to life if a man cannot hear the lonely cry of the whippoorwill or the arguments of the frogs around a pond at night? I am a red man and do not understand.


The Indian prefers the soft sound of the wind darting over the face of a pond, and the smell of the wind itself, cleaned by a midday rain, or scented with the pinion pine.


The air is precious to the red man, for all things share the same breath--the beast, the tree, the man, they all share the same breath.


The white man does not seem to notice the air he breathes.


Like a man dying for many days, he is numb to the stench.


But if we sell you our land, you must remember that the air is precious to us, that the air shares its spirit with all the life it supports. The wind that gave our grandfather his first breath also receives his last sigh.


And if we sell you our land, you must keep it apart and sacred, as a place where even the white man can go to taste the wind that is sweetened by the meadow's flowers.


So we will consider your offer to buy our land. If we decide to accept, I will make one condition: The white man must treat the beasts of this land as his brothers.


I am a savage and I do not understand any other way.


I've seen a thousand rotting buffaloes on the prairie, left by the white man who shot them from a passing train.


I am a savage and I do not understand how the smoking iron horse can be more important than the buffalo that we kill only to stay alive.


What is man without the beasts? If all the beasts were gone, man would die from a great loneliness of spirit.


For whatever happens to the beasts, soon happens to man. All things are connected.


You must teach your children that the ground beneath their feet is the ashes of your grandfathers. So that they will respect the land, tell your children that the earth is rich with the lives of our kin.


Teach your children what we have taught our children, that the earth is our mother.


Whatever befalls the earth befalls the sons of the earth. If men spit upon the ground, they spit upon themselves.


This we know: The earth does not belong to man; man belongs to the earth. This we know.


All things are connected like the blood which unites one family. All things are connected.


Whatever befalls the earth befalls the sons of the earth.


Man did not weave the web of life: he is merely a strand in it.


Whatever he does to the web, he does to himself.


Even the white man, whose God walks and talks with him as friend to friend, cannot be exempt from the common destiny.


We may be brothers after all.


We shall see.


One thing we know, which the white man may one day discover, our God is the same God. You may think now that you own Him as you wish to own our land; but you cannot. He is the God of man, and His compassion is equal for the red man and the white.


This earth is precious to Him, and to harm the earth is to heap contempt on its Creator.


The whites too shall pass; perhaps sooner than all other tribes. Contaminate your bed, and you will one night suffocate in your own waste.


But in your perishing you will shine brightly, fired by the strength of God who brought you to this land and for some special purpose gave you dominion over this land and over the red man.


That destiny is a mystery to us, for we do not understand when the buffalo are all slaughtered, the wild horses are tamed, the secret corners of the forest heavy with scent of many men, and the view of the ripe hills blotted by talking wires.