Uma observação superficial nos mostra que, das quatro partes da entidade humana, o eu é o mais imperfeito, uma vez que o homem só desperta de vez em quando para a verdadeira autoconsciência e atua só em casos excepcionais com verdadeira reflexão e livre arbítrio.
Mas também o corpo astral com seus desejos e paixões desenfreados, suas cobiças, seus instintos viciados, está longe da perfeição.
Já as funções vitais, e mais ainda, os processos puramente físicos, estão-se desenrolando em relativa harmonia, a não ser que sofram os reflexos de uma vida anímica e espiritual defeituosa.
A investigação esotérica confirma plenamente essa suposição, mas para bem compreender a situação presente é necessário conhecer algo da evolução que a ela conduz.
Foram elas que formaram e plasmaram todos os membros da sua entidade.
As forças que assim atuaram sobre ele nem sempre emanaram de entes favoráveis que quisessem influenciá-lo de modo harmonioso. Havia forças contrárias e opostas aos seres favoráveis, e cujas influências se revelaram perturbadoras. Veremos mais tarde que o homem é o produto do combate entre essas forças antagônicas.
Mesmo admitindo que a vidência permita observar fatos não-físicos atuais, como é possível que o iniciado possa descrever o que se passou em épocas remotas, quando nada era parecido com o mundo atual?
Lembremos que a memória do homem individual "reside" em seu corpo etérico.
Pois bem: assim como os fatos vividos pelo homem estão "gravados" em seu corpo etérico, assim a substância etérica cósmica recebe a "impressão" de todo e qualquer fato que ocorre no mundo. O clarividente pode, a um determinado grau do seu desenvolvimento iniciático, dirigir o seu "olhar" espiritual para esse mundo etérico como o dirige para o corpo etérico de uma planta ou de outro homem. Ele poderá então "ler" nessa memória cósmica as impressões feitas em tempos passados. Sendo essa memória etérica denominada pelo velho termo hindu de Akasha, o esoterismo moderno diz, empregando uma imagem bastante pitoresca, que o vidente está "lendo a crônica do Akasha".
A Antroposofia, empregando os meios de observação aludidos, remonta muito mais longe, descrevendo estados pré-materiais durante os quais já existia o homem, ou antes, precursores do homem.
A Antroposofia tem por objeto o homem, e assim procuraremos descobrir o momento do passado onde aparece o primeiro vestígio do homem.
Esse corpo era como que uma massa ainda não individualizada de matéria, e essa matéria era tão sutil que poderia lembrar apenas o que chamamos hoje de "calor".
Já o estado gasoso, e muito mais os estados líquido e sólido, eram inconcebíveis nesse cosmo de extrema sutileza.
Outras hierarquias começaram então a atuar; sob sua influência, a massa informe começou a diferenciar-se numa infinidade de pequenas partículas.
Para caracterizar esse estado, Rudolf Steiner emprega a imagem de uma gigantesca amora, onde cada pequena esfera seria um precursor de um corpo físico humano atual.
Esse precursor de "nós" não tinha ainda vida própria; seu grau de consciência (se é que podemos falar de um símile de consciência) era equivalente àquele dos atuais minerais.
Essa "noite cósmica", comparada a uma sístole universal, é designada pelo nome hindu de Pralaya.
Primeiro houve uma espécie de recapitulação da época anterior. Formou-se novamente um corpo de calor. Mas em dado momento, e novamente como resultado da atuação das hierarquias superiores, os precursores do nosso corpo físico receberam um corpo etérico e começaram a aparentar formas rudimentares de vida própria.
O corpo físico passou ao estado gaseiforme, embora contivesse também o elemento de calor ou fogo. Nesse estado, "nós" tínhamos, portanto, o grau de evolução de uma planta (corpo físico e corpo etérico) tendo a substancialidade de um gás.
O "nosso" grau de consciência naquela segunda encarnação da nossa Terra também era aquele de uma planta, isto é, de sono profundo.
Esses seres não puderam acompanhar, na segunda encarnação, a evolução dos demais, tendo, ao contrário, que recapitular o estado que seus irmãos mais avançados já haviam terminado no Velho Saturno.
Havia, pois, no Antigo Sol (pois é esse o nome que se dá à segunda encarnação desse Universo) dois reinos: um evoluído, tendo o grau de desenvolvimento de uma planta, e possuindo um corpo físico e um corpo etérico; e outro atrasado, que ainda percorria - pela segunda vez - a existência equivalente à de um mineral, sem corpo etérico.
Havia, pois, dois corpos possuindo configuração e características diferentes, e que atuavam um sobre o outro. Devemos imaginar esses corpos permeados e atravessados pelas hierarquias e suas influências, sob cuja ação o precursor do homem evoluiu, até que tudo voltou novamente a um pralaya, ou noite cósmica. Antes disso, os dois corpos se tinham reunido novamente. Convém frisar que esses dois estados planetários não tem nenhuma semelhança com o Saturno e o Sol atuais.
Após nova recapitulação dos estados anteriores, a condensação progrediu até a inclusão do elemento líquido, dando à matéria mais densa a forma de uma neblina ou de um gel.
Novamente as hierarquias mais sutis, não podendo acompanhar essa densificação, formaram um novo corpo equivalente ao Sol. Originaram-se daí certos movimentos rotativos e estados alternados de irradiação.
Em baixo dele havia dois reinos; aqueles que haviam recapitulado no Velho Sol, com sucesso, a evolução proto-saturnina, e que nessa altura atingiram o nível de planta; e aqueles que também no Velho Sol não conseguiram progredir, tendo que percorrer agora, mais uma vez, um estado de mineral.
A interação de todas essas influências fez com que o mundo se diversificasse ainda mais: houve até a formação de outros "planetas", centros de atuação espiritual dos vários grupos de hierarquias.
O corpo astral já lhe proporcionava sensações, instintos, antipatia e simpatia, mas sem a faculdade de livre-arbítrio e sem o raciocínio, apanágios da plena consciência que nasceriam apenas com o eu.
Outrossim, a "forma" exterior do homem, como aliás, o aspecto de todo o mundo ao redor dele, não podiam ser comparados a nada do que atualmente existe.
No momento da sua maior concentração, a Velha Lua, com os germes dos homens, não passava de uma massa úmida ou viscosa com inclusões gasosas. Nesse mundo viviam, além dos seres das hierarquias, os homens, cujo membro mais elevado era um corpo astral; e, abaixo deles, aqueles que haviam ficado para trás, constituindo dois reinos equivalentes às nossas plantas e minerais. Processos semelhantes à respiração e circulação já existiam, e os estados de consciência mais ou menos clara alternavam, de acordo com as circunvoluções dos corpos celestes, sedes das hierarquias em seus vários agrupamentos.
Um terceiro período de involução (Pralaya) fez voltar toda a diversificação a um estado puramente espiritual do qual emergeria, como quarta fase, a nossa Terra atual com o sistema solar que ela integra.