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sexta-feira, 25 de março de 2011

Física Quântica



Há pouco mais de cem anos, o físico Max Planck, considerado conservador, tentando compreender a energia irradiada pelo espectro da radiação térmica, expressa como ondas eletromagnéticas produzidas por qualquer organismo emissor de calor, a uma temperatura x, chegou, depois de muitas experiências e cálculos, à revolucionária ‘constante de Planck’, que subverteu os princípios da física clássica.


Este foi o início da trajetória da Física ou Mecânica Quântica, que estuda os eventos que transcorrem nas camadas atômicas e sub-atômicas, ou seja, entre as moléculas, átomos, elétrons, prótons, pósitrons, e outras partículas. Planck criou uma fórmula que se interpunha justamente entre a Lei de Wien – para baixas frequências – e a Lei de Rayleight – para altas frequências -, ao contrário das experiências tentadas até então por outros estudiosos.


Albert Einsten, criador da Teoria da Relatividade, foi o primeiro a utilizar a expressão "quantum" para a constante de Planck E = hv, em uma pesquisa publicada em março de 1905 sobre as consequências dos fenômenos fotoelétricos, quando desenvolveu o conceito de fóton. Este termo se relaciona a um evento físico muito comum, a quantização – um elétron passa de uma energia mínima para o nível posterior, se for aquecido, mas jamais passará por estágios intermediários, proibidos para ele, neste caso a energia está quantizada, a partícula realizou um salto energético de um valor para outro. Este conceito é fundamental para se compreender a importância da física quântica.


Seus resultados são mais evidentes na esfera macroscópica do que na microscópica, embora os efeitos percebidos no campo mais visível dependam das atitudes quânticas reveladas pelos fenômenos que ocorrem nos níveis abaixo da escala atômica. Esta teoria revolucionou a arena das idéias não só no âmbito das Ciências Exatas, mas também no das discussões filosóficas vigentes no século XX.


No dia-a-dia, mesmo sem termos conhecimento sobre a Física Quântica, temos em nossa esfera de consumo muitos de seus resultados concretos, como o aparelho de cd, o controle remoto, os equipamentos hospitalares de ressonância magnética, até mesmo o famoso computador.


A Física Quântica envolve conceitos como os de partícula – objeto com uma mínima dimensão de massa, que compõe corpos maiores – e onda – a radiação eletromagnética, invisível para nós, não necessita de um ambiente material para se propagar, e sim do espaço vazio. Enquanto as partículas tinham seu movimento analisado pela mecânica de Newton, as radiações das ondas eletromagnéticas eram descritas pelas equações de Maxwell. No início do século XX, porém, algumas pesquisas apresentaram contradições reveladoras, demonstrando que os comportamentos de ambas podem não ser assim tão diferentes uns dos outros. Foram essas idéias que levaram Max Planck à descoberta dos mecanismos da Física Quântica, embora ele não pretendesse se desligar dos conceitos da Física Clássica.


A conexão da Mecânica Quântica com conceitos como a não-localidade e a causalidade, levou esta disciplina a uma ligação mais profunda com conceitos filosóficos, psicológicos e espirituais. Hoje há uma forte tendência em unir os conceitos quânticos às teorias sobre a Consciência.


Físicos como o indiano Amit Goswami se valem dos conceitos da Física moderna para apresentar provas científicas da existência da imortalidade, da reencarnação e da vida após a morte. Professor titular da Universidade de Física de Oregon, Ph.D em física quântica, físico residente no Institute of Noetic Sciences, suas idéias aparecem no filme Quem somos nós? e em obras como A Física da Alma, O Médico Quântico, entre outras. Ele defende a conciliação entre física quântica, espiritualidade, medicina, filosofia e estudos sobre a consciência. Seus livros estão repletos de descrições técnicas, objetivas, científicas, o que tem silenciado seus detratores.


Fritjof Capra, Ph.D., físico e teórico de sistemas, revela a importância do observador na produção dos fenômenos quânticos. Ele não só testemunha os atributos do evento físico, mas também influencia na forma como essas qualidades se manifestarão.

A consciência do sujeito que examina a trajetória de um elétron vai definir como será seu comportamento.

Assim, segundo o autor, a partícula é despojada de seu caráter específico se não for submetida à análise racional do observador, ou seja, tudo se interpenetra e se torna interdependente, mente e matéria, o indivíduo que observa e o objeto sob análise.

Outro renomado físico, prêmio Nobel de Física, Eugen Wingner, atesta igualmente que o papel da consciência no âmbito da teoria quântica é imprescindível.

Por Ana Lucia Santana

Fonte:
infoescola

sábado, 19 de fevereiro de 2011

A Consciência para Amit Goswami




Capra iniciou este debate há quase 30 anos. Contudo, apesar de ter realizado um tra­balho inestimável, e de ser um físico culto e informado, ele não fazia parte da or­todoxia da física acadêmica, o que já não ocorre com Amit Goswami, que pode­mos chamar de seu sucessor.

Amit Goswami vive nos Estados Unidos e é Ph.D. em física quântica, autor de numerosos artigos científicos clássicos, além de pro­fessor titular de física no Instituto de Física Teórica da Universidade do Oregon.

Recentemente, Goswami sacudiu o mundo da física ao postular que, através dos paradoxos surgidos no início do século XX, com o nascimento da física quânti­ca, é possível afirmar exatamente o oposto do que metade do presente livro afir­mou até agora, ou seja, é a consciência que cria a matéria, e não o oposto.

Amit foi rotulado de místico por alguns setores da comunidade científica, porém, acal­mou os críticos através de várias publicações técnicas que dão respaldo e credi­bilidade às suas idéias.

Amit Goswami tem procurado demonstrar que o univer­so carece de uma consistência matemática, e que sem a existência de um conjun­to superior, no caso uma consciência cósmica organizadora, ou mesmo Deus, tor­na-se paradoxal explicar o funcionamento do cosmo.

A relação corpo-mente no passado distante acreditava na dualidade entre matéria (corpo) e mente (espírito). Com o advento das neurociências, atualmente é inquestionável que a nossa intricada mente sur­ge da crescente complexidade da integração neuronal. Quanto mais neurônios e quanto mais sinapses, mais complexa é a nossa mente. Sendo assim, mente/cons­ciência é um conceito dependente da matéria. Neste ponto entra Goswami, ques­tionando o nível molecular da matéria. Se o encéfalo é o forjador das mentes, quem é o forjador dos encéfalos?

No nível molecular, as dúvidas geradas pelas partículas subatômicas são inúmeras, mas é exatamente através dessas dúvidas, fortemente alicerçadas sobre uma miríade de fórmulas matemáticas inquestioná­veis até o presente momento, que Goswami afirma: a mente não é a consciência.

A consciência vai além da mente, e é ela a responsável por fixar a matéria no cos­mo. Explicar os conceitos de Goswami em algumas linhas é uma tarefa inglória. Contudo, arriscaremo-nos nesta pequena empreitada.

A parte I de seu livro, "O universo autoconsciente": como a consciência cria o mundo material, é iniciada com uma crítica cáustica a nossa atual for­ma de pensar:

"Um nível crítico de confusão satura o mundo contemporâneo. Nossa fé nos componentes espirituais da vida - na realidade vital da consciência, dos valores e de Deus - está sendo corroída sob o ataque implacável do materialismo científico. Por um lado, recebemos de braços abertos os benefícios gerados por uma ciência que assume a visão mundial materialista. Por outro, essa visão, predominante, não consegue corresponder às nossas intuições sobre o significado da vida.

Nos últimos 400 anos, adotamos gradualmente a crença de que a ciência só pode ser construída sobre a idéia de que tudo é feito de matéria - os denominados átomos. em um espaço vazio. Viemos a aceitar o materialismo como dogma, a despeito de sua incapacidade de explicar as experiências mais simples de nossa vida diária. Em suma, temos uma visão de mundo incoerente. As tribulações em que vivemos alimentaram a exigência de um novo paradigma - uma visão unificadora do mundo que integre mente e espírito na ciência. Nenhum novo paradigma, contudo, emergiu até agora."

Para Goswami, a consciência pode ser definida como: o agente que afeta objetos quânticos para lhes tornar o comportamento apreensível pelos sentidos.

Talvez, para uma melhor compreensão, tenhamos que adentrar nas definições concedidas aos objetos classificados de clássicos ou quânticos.

Desde a época de Newton, nossa física adequa-se a um sistema filosófico conhecido como realista-materialista. Os físicos materialistas, também conheci­dos como físicos clássicos, acreditavam que, se conhecêssemos um determinado ponto no espaço, poderíamos facilmente prever o seu comportamento em qual­quer momento futuro. Sendo assim, Deus nada mais era do que o maior dos ma­temáticos. O universo começou a ser verdadeiramente decifrado através da genia­lidade de Isaac Newton.

O cosmo passou a ser encarado como um gigantesco re­lógio, e acreditava-se que, no futuro, o homem chegaria a uma equação do Tudo, a uma equação que provasse a existência Dele.

Einstein passou grande parte de sua vida em busca da equação divina, mas só conseguiu equações menores, mui­to embora absolutamente revolucionárias: E=m.c2 explicita um dos maiores sal­tos intelectuais de todos os tempos.

No entanto, Einstein viveu as glórias de sua teoria da relatividade e as dú­vidas perturbadoras oriundas da física quântica. O sistema filosófico, que jun­to com a relatividade mudou nossa forma de encarar o universo, introduziu o caos onde outrora habitava a ordem inabalável do grande relógio universal de Newton.

Na medida em que físicos como Bohr e Heisenberger penetravam no inte­rior da matéria, desvendando as interações entre as partículas subatômicas, eles foram apresentados a um universo evasivo, fugaz, escorregadio e absolutamen­te imprevisível:

1) Partículas supostamente feitas de matéria, como um elétron, apre­sentavam, e ainda hoje continuam apresentando, comportamen­tos que absolutamente negam todos os pressupostos de nossa fi­losofia realista-materialista: a física clássica. Melhor dizendo, implodem, sem nenhum pesar, nossa arrogância matemática des­tinada a realizar previsões 100% corretas.

2) Um objeto quântico pode estar em mais de um lugar no mesmo instante, e isso é inadmissível para as leis do grande relógio. Se quisermos afirmar que o elétron de fato existe, precisamos levar em conta a presença de um observador, de uma consciência.

3) É sabido que, dependendo do tipo de pesquisa e do tipo de apa­relho utilizado para se investigar o comportamento de um único elétron, podemos afirmar que ora o mesmo é uma partícula, ora comporta-se como uma onda no espaço. É impossível afirmar que um objeto quântico se manifesta no espaço-tempo até que o observemos como uma partícula, e, neste ponto, a consciência produz o colapso da onda.

4) Um objeto quântico parece saltar os limites do espaço-tempo. Isso significa dizer que quando um elétron recebe uma determi­nada quantidade de energia, pode saltar para outras camadas per­tencentes ao átomo em questão, para outras eletrosferas.

Contu­do, nas medições realizadas nos modernos laboratórios de físi­ca, não se consegue detectar o trajeto do elétron através do es­paço interveniente, e a isso se denomina salto quântico. Falando de uma forma mais simples, o comportamento desse minúsculo ponto de matéria é absolutamente estranho, e o que se assemelha ao fato de você estar em São Paulo e simplesmente aparecer em Vitória do Espírito Santo, sem que necessite transitar pelo já ci­tado espaço interveniente.

Por que os pressupostos da física quântica não nos fazem pensar mais profundamente nessas questões? Provavelmente, a resposta alicerça-se no fato de que a física quântica só pode ser averiguada no microuniverso perten­cente ao reino dos átomos e dos elétrons. Somente investigadores afins aca­bam sendo tocados por essas interessantes constatações, que geram terremo­tos filosóficos em suas mentes. Pouquíssimas pessoas estão aptas a discu­tir com fundamento as questões quânticas do universo, e alguns físicos che­gam mesmo a afirmar que as repercussões filosóficas a respeito de nós mes­mos são tão intensas e perturbadoras, que muitos de nós não teríamos estru­tura psicológica suficiente para lidar com as questões geradas no cerne des­sas descobertas.

"Agora, passemos à questão importante: por que há tanto consenso? Por duas razões, o mundo fenomenal parece esmagadoramente objetivo. Em primeiro lugar, corpos clássicos possuem massas imensas, o que significa que suas ondas quânticas se espalham com grande lentidão. O pequeno espalhamento torna bem previsíveis as trajetórias do centro da massa de macro objetos (sempre que se olha encontramos a lua onde se espera que ela esteja), criando, dessa maneira, uma aura de continuidade. Continuidade adicional é imposta pelo aparato perceptual de nosso próprio encéfalo-mente."

A palavra transcendência tem sido empregada com certa frequência nos trabalhos de física. Não como se costuma empregá-la, de forma rotineira e mui­tas vezes inconseqüente, no afã de explicar o que para nós é inexplicável. Para os físicos, transcendência passa a ser um conceito, até certo ponto, matematica­mente provado. Para onde vai o elétron no momento do salto quântico? Não se sabe ao certo, mas matematicamente está provado que o mesmo não está nem em nosso conhecido espaço, nem tão pouco em nosso velho amigo tempo. Sendo as­sim, alguns físicos afirmam que o elétron transcendeu o espaço-tempo. A diferen­ça de um texto de física quântica para um texto esotérico sem fundamentação é que o primeiro não faz afirmações descabidas a respeito do suposto universo para o qual o elétron transcendeu. Os físicos costumam parar no abismo da transcen­dência, assumindo humildemente suas limitações intelectuais na compreensão de tão perturbadora questão.

Se para uma pessoa comum, um indivíduo não versado em ciências, essas questões não perturbam, é pelo fato de que esses conceitos não che­gam facilmente aos veículos de divulgação científica.

Note como a evolu­ção de um conceito micro atinge facilmente o macro:

*átomos são compos­tos, dentre outras coisas, de elétrons;
*elétrons transcendem o espaço-tempo conhecido;
*átomos unidos formam moléculas;
*é lícito supor que parte das moléculas transcende o espaço-tempo em algumas ocasiões; *moléculas uni­das formam pedras, plantas, animais.

Sendo assim, parte da matéria, ora está aqui, ora não está; ora está presente, ora está ausente.

Não podemos afirmar que a física quântica vale para um átomo e não para uma molécula, pois os mesmos elétrons que compõem o átomo isolado compõem a molé­cula em questão.

Nagarjuna, filósofo da tradição budista mahayana, costumava dizer:

Ela não existe.
Ela não não existe.
Ela não existe e não não existe simultaneamente.
Nem ela não existe nem não não existe.

A quem Nagarjuna se refere? À realidade última. E o que é real é uma história longa que estamos desenvolvendo desde os primeiros tempos. O elétron é onda ou é partícula? O elétron está no espaço-tempo ou não está no espaço-tempo?

Essas questões vibram em nossa mente, assim como os vrttis de Patañjali. A dualidade onda-partícula intriga os físicos quânticos de hoje, assim como a dualidade mente-corpo intrigou Patañjali há séculos atrás. A diferença entre ambos é que Patañjali era um intuitivo e os físicos atuais atingiram o abis­mo através da lógica matemática.

Um dos mentores da física quântica, Niels Bohr, é um dos defensores do princípio da complementaridade:

"Bohr descreveu uma maneira nova de estudar o paradoxo da dualidade onda-partícula. As naturezas de onda e partícula do elétron não são dualísticas, nem simplesmente polaridades opostas, disse Bohr: São propriedades complementares, que nos são reveladas em experimentos complementares.
Quando tiramos uma foto de duração de um elétron, estamos revelando-lhe a natureza de onda; quando lhe seguimos a trajetória em uma câmara de condensação, observamos-lhe a natureza de partícula.
Os elétrons não são ondas nem partículas. Poderíamos chamá­-los de "ondículas", porquanto sua verdadeira natureza transcende ambas as descrições. Este é o principio da complementaridade.
Uma vez que pensar que o mesmo objeto quântico tem atributos aparentemente tão contraditórios com ondulação e fixidez pode ser perigoso para a nossa sanidade mental, a natureza nos forneceu um tampão.
O princípio de complementaridade de Bohr assegura-nos que, embora os objetos quânticos possuam os atributos de onda e partícula, só podemos medir um único aspecto da ondícula com qualquer arranjo experimental, em qualquer dada ocasião.
Pela mesma razão, escolhemos o aspecto particular da ondícula que queremos ver ao escolher o apropriado arranjo experimental."

Amit Goswami tem proposto que, uma vez a matéria sendo instável e transcendente, torna-se necessária a existência de uma consciência para paralisá-­la momentaneamente, criando assim a ilusão da estabilidade.

A natureza é dinâ­mica e complementar, como sugeriu Bohr. A espiritualidade já afirma a instabili­dade da natureza há muitos anos. Na literatura vedanta da Índia, a palavra 'rupa' significa a forma imanente da natureza, sendo a palavra 'nama' usada para dar sig­nificado aos arquétipos transcendentes.

Para muito além de 'nama' e 'rupa', brilha a luz de Brahman, a grande consciência universal, o fundamento de todo ser.

Na fi­losofia budista, os reinos das idéias e material são denominados Sambhogakaya e Nirmanakaya, respectivamente. Todavia, pairando sobre esses reinos, encontra­-se a consciência única, Dharmakaya, que ilumina ambos.

O símbolo taoísta do ying e yang também explicita o reino transcendente da matéria e o reino imanente da mesma, sendo Tao o princípio organizador que ora permite a luz, ora as trevas.

A física quântica, muito embora menos poética que a literatura espiritual, transi­ta, ora como onda, ora como partícula, ora identificando o elétron, ora perdendo-­o para um suposto universo que transcende o espaço-tempo conhecido, sendo a responsável pela fixação da "realidade", a consciência do observador.

Para Amit Goswami, a vida apresenta-se para os seres humanos como uma película de cinema. Entre cada foto, existe um abismo transcendente da não-foto. Contudo, a velocidade de nossa percepção não nos permite perceber as constan­tes trocas entre fotos e não-fotos; percebemos somente a continuidade do filme. Assim como no cinema, o mundo material é instável, oscilando através das re­gras quânticas. Contudo, nossa percepção é incapaz de perceber essa instabilida­de da matéria, pois a consciência maior fixa nossa percepção em somente uma das possibilidades.

No ano de 2002, Amit Goswami participou do programa Roda Viva, da TV Cultura. Suas idéias foram explicitadas com clareza diante de uma bancada de entrevistadores formada por físicos, jornalistas, psiquiatras, filósofos, psicó­logos e teólogos.

Amit se esforçou por deixar claro que continua a transitar pela ciência ortodoxa, mas afirmou que a mesma passa por um período de crise exis­tencial, e que sua proposta é, através dos pressupostos teóricos da física quân­tica, inserir a noção de Deus como fator fundamental na matemática probabi­lística da nova física, estreitando, assim, as lacunas entre ciência e religião.

Al­gumas de suas idéias foram por mim escolhidas para representar sua filosofia, o idealismo monista:

"Esta mudança da ciência de uma visão materialista para uma visão espiritualista, foi quase totalmente devida ao advento da física quântica.
Ao mesmo tempo, houve algumas mudanças em psicologia transpessoal, em biologia evolucionista e em medicina.
Mas acho que é correto dizer que a revolução que a física quântica causou na física, na virada do século XX, seria baseada nessas transições contínuas, não apenas movimento contínuo, mas também descontínuo.
Não-localidade. Não apenas transferência local de informações, mas transferência não-local de informações.
E, finalmente, o conceito de causalidade descendente.
É um conceito interessante, pois os físicos sempre acreditaram que a causalidade subia a partir da base: partículas elementares, átomos, para moléculas, para células, para encéfalo. E o encéfalo é tudo. O encéfalo nos dá consciência, inteligência, todas essas coisas.
Mas descobrimos, na física quântica, que a consciência é necessária, o observador é necessário. É o observador que converte as ondas de possibilidades, os objetos quânticos, em eventos e objetos reais. Essa idéia de que a consciência é um produto do encéfalo nos cria paradoxos.
Em vez disso, cresceu a idéia de que é a consciência que também é causal.
Assim, cresceu a idéia da causalidade descendente.
Eu diria que a revolução que a física quântica trouxe, com três conceitos revolucionários, movimento descontínuo, interconectividade não- localizada e, finalmente, somando-se ao conceito de causalidade ascendente da ciência newtoniana normal, o conceito de causalidade descendente, a consciência escolhendo entre as possibilidades, o evento real.
Esses são os três conceitos revolucionários.
Então, se houver causalidade descendente, se pudermos identificar essa causalidade descendente como algo que está acima da visão materialista do mundo, então, Deus tem um ponto de entrada. Agora sabemos como Deus, se quiser, a consciência, interage com o mundo: através da escolha das possibilidades quânticas."

Que fique claro que, no presente momento, consciência não é sinônimo de mente. Para as neuro­ciências, a interação dos neurônios, fruto de sua herança genética e suas experiências cotidianas, pode criar o conceito de mente. Todavia, a matemática quântica pro­posta por Goswami concede à consciência a primazia de preceder o encéfalo e, segundo ele, o encéfalo material só existe pelo fato dessa consciência escolhê-lo dentre as possibilidades vigentes.

Os próprios físicos quânticos fizeram todo o esforço possível no intuito de negar a importância de um observador nos fenômenos físicos, todavia, atualmen­te é consenso entre eles que os objetos quânticos são matematicamente inconsis­tentes e inexistem sem a introdução da consciência:

"Na física quântica, por sete décadas, tentou-se negar o observador. De alguma forma, achava-se que a física deveria ser objetiva. Se dessem um papel ao observador, a física não seria mais objetiva. A famosa disputa entre Bohr e Einstein, a que se refere essa disputa, basicamente, sempre terminava com Bohr ganhando a discussão, mostrando que não há fenômeno no mundo, a menos que ele seja registrado. Bohr não usou a consciência, mas, atualmente, vem crescendo o consenso, muito lentamente, de que a física quântica não está completa, a menos que concordemos que nenhum fenômeno é um fenômeno, a menos que seja registrado por um observador, na consciência de um observador. E isso se tornou a base da nova ciência. É a ciência que, aos poucos, mas com certeza, vem integrando os conceitos científicos e espirituais."

Talvez seja interessante reproduzir, com as palavras do próprio Amit, a sua compreensão do conceito de Deus, pois não são poucas as pessoas que, de forma impulsiva, classificam cientistas como Goswami de místicos somente pelo fato desses pesquisadores introduzirem conceitos divinos em um mundo que se acos­tumou a viver uma objetividade que, no presente, não se sustenta mais:

"Os conceitos da física clássica, no início, não separavam Deus, como disse, mas então, aos poucos, descobriu-se que Deus não era necessário. Depois que Deus estabeleceu o movimento do mundo, ele passou a ser guardião de seu jardim, e isso é o que a maioria dos físicos clássicos pode fazer. Mas, na física quântica, há o problema da medição. Como as possibilidades tornam-se eventos reais, temos espaço para uma consciência, e ela deve ser uma consciência cósmica. Há uma semelhança com o modo como Deus é retratado, pelo menos na subespiritualidade tradicional, não na mente popular. A mente popular considera Deus um imperador um super-­humano sentado no céu. Essa imagem de Deus não é científica, e espero que esteja claro que não estamos falando em Deus desta forma, mas Deus nessa consciência mais cósmica, nessa forma mais estrutural. Esse tipo de Deus está retornando porque, o debate entre teólogos e cientistas sempre foi: Deus é o guardião ou Deus intervém? Teólogos afirmam que Deus intervém nos seres biológicos.

E então surgiu Darwin. Foi um grande golpe nos teólogos, porque antes, apesar de Newton, os teólogos podiam citar o exemplo da biologia, cujo propósito é muito óbvio, pelo menos, óbvio para a maioria. Mas a teoria de Darwin foi um golpe porque se dizia que a evolução ocorria... Mas ela era natural? Darwin disse que ela era natural. Oportunidade e necessidade. Não há necessidade de Deus na evolução, e não há necessidade de Deus na biologia. Então, no século XX, surgiu o behaviorismo e a idéia de que temos livre-arbítrio subjetivo. Essa idéia também foi superada, porque experimentos mostraram que somos muito condicionados, não há livre-arbítrio. Contra tudo isso, vejam só, a física quântica também cresceu ao mesmo tempo em que o behaviorismo, e a física quântica tem uma coisa peculiar: o princípio da incerteza. O mundo não está determinado como imaginamos. Deus não é o guardião. O princípio da incerteza levou à onda de possibilidades, depois o colapso da onda de possibilidades para a introdução da idéia do colapso da consciência. Paradoxalmente, fomos criados contra essa idéia, mas nos anos 90, eu, Henry Stab, Fred Allan Wolf, Nick Herbert, todos mostramos que esse paradoxo pode ser resolvido.

Não há paradoxo se presumirmos que a consciência que causa o colapso da onda de possibilidades em eventos reais é uma consciência cósmica. E o evento do colapso em si nos dá a separação matéria-objeto do mundo. Assim, não só resolvemos o problema da medição quântica como também demos uma nova resposta de como a consciência de um torna-se várias. Como ela se divide em matérias e objetos, para poder ver a si mesma. E essa idéia de que o mundo é um jogo da consciência, um jogo de Deus, que é uma idéia muito mística, voltou à tona. Então, podemos voltar à biologia. Deus intervém na biologia? Deus intervém na vida das pessoas? Essas perguntas continuam tendo respostas muito positivas. Vi, em um jornal sobre biologia evolucionista, que há muitos furos conhecidos na teoria darwiniana. Esses furos são chamados sinais de pontuação. A teoria da evolução de Darwin explica alguns estágios homeostáticos da evolução, ou seja, como as espécies adaptam-se a mudanças ambientais. Mas não explica como uma espécie torna-se outra. Essa especiação, mudança de uma espécie em outra, é uma nova mudança na evolução, não está na teoria de Darwin. Experimentalmente, isso é demonstrado em lacunas de fósseis. Não temos uma continuidade de fósseis mostrando como um réptil tornou-se um pássaro.

A idéia é que sejam sinais de pontuação: estágios muito rápidos de evolução. Eu sugiro que isto seja um salto quântico, um salto quântico na evolução. Nesse salto quântico, a consciência interveio, não de um modo subjetivo, de um modo caprichoso, mas de um modo muito objetivo, muito objetivo, e essas idéias objetivas ficam claras com o trabalho de Rupert Sheldrake e outros, o modo como isso pode ser objetivo. Mas, sem dúvida alguma, há uma intervenção da causalidade descendente. Não se pode explicar a biologia evolucionista só com a causalidade ascendente. Essa é a coisa mais interessante, a partir do pensamento original dos físicos de que Deus deve ser o guardião, pois tudo pode ser explicado e tudo é determinado, que não precisamos de Deus. Agora, estamos fechando o círculo, e vemos que não só precisamos de Deus: há movimentos descontínuos no mundo para os quais não existe explicação matemática ou lógica. Ainda assim, é totalmente objetivo, não é arbitrário. Deus age de forma objetiva, bem definida. A consciência cósmica não é subjetiva, não é a consciência individual que afeta o mundo.

Isso ocorre de forma cósmica, podemos discutir objetivamente. A ciência detém seu poder, sua objetividade e, ainda assim, temos agora a descontinuidade, temos a interconectividade e podemos falar sobre vários assuntos dos quais os místicos tradicionalmente falam."

As idéias de Amit Goswami parecem absolutamente sem fundamenta­ção empírica. Contudo, em seu livro, Goswami fundamenta todos os seus pressu­postos com base em experimentos absolutamente científicos advindos dos labo­ratórios de física, assim como dos laboratórios de neurociências espalhados pelo mundo. No entanto, manter-se informado sobre tudo o que está acontecendo no planeta Terra, nas mais diversificadas áreas do saber, e ainda tentar tecer coeren­temente a teia do conhecimento é um trabalho que demanda anos.

Cada cientis­ta tem trabalhado de forma aparentemente isolada, e somente "gênios" da ciência têm o poder e a coragem de, ao se expor, propor visões unificadoras. São muitos os exemplos que embasam as propostas de Goswami, e ele mesmo explicita um deles, advindo das neurociências:

"Em 1993 e 1994, o neurofisiologista mexicano Jacob Grinberg-­Zylberbaum e seus colaboradores fizeram um experimento, no qual havia dois observadores meditando por 20 minutos, com o propósito de terem comunicação direta. Comunicação direta no estilo de não-localidade. Sinais não-locais ocorrendo entre eles, e ainda assim eles teriam comunicação. Certo, eles meditaram juntos. Pediu-se que mantivessem o estado meditativo durante o resto do experimento. Mas então, um deles é levado para outro recinto. Eles ficam em câmaras de Faraday, onde não é possível a comunicação eletromagnética. Os encéfalos deles são monitorados. Uma das pessoas vê uma série de 'flashes' brilhantes, o encéfalo dele responde com atividade elétrica, obtém-se o potencial de resposta muito claro, picos muito claros, fases muito claras. O encéfalo da outra pessoa mostra atividade, a partir da qual obtém-se um potencial de transferência que é muito semelhante em força e 70% idêntico em fases ao potencial de resposta da primeira pessoa. O mais interessante é que, se você pegar duas outras pessoas, duas pessoas que não meditaram juntas, ou pessoas que não tinham a intenção de se comunicar, para elas, não há potencial de transferência. Mas para pessoas que meditam juntas, invariavelmente, muitas vezes, um em cada quatro casos, obtém-se o fenômeno de potencial de transferência. E Peter Fenwick, na Inglaterra, há dois anos, confirmou isso, repetindo o experimento."

Mais uma vez, fica explícita a velocidade com que a ciência tem transita­do em nossos dias. Michael Persinger sequer chegou a ser conhecido mundial­mente pelos seus trabalhos de comunicação através do eletromagnetismo, e no­vas pesquisas já evidenciam a possibilidade de uma comunicação não-local entre dois encéfalos. Por não-local entenda-se não pontuada por nenhum tipo de sinal conhecido por nós. O experimento a que Amit Goswami faz referência identifi­cou padrões de comunicação entre dois encéfalos isolados de todo e qualquer si­nal eletromagnético.

Que fique claro para o leitor que essa pesquisa não invalida as evidências propostas por Persinger, sendo que Persinger transitaria, por assim dizer, nas novas possibilidades de comunicação no reino imanente, e Jacob Grin­berg-Zylberbaum inicia a identificação de uma suposta comunicação não-local. Ao que parece, comunicação que transcende o espaço-tempo conhecido.

Durante o programa Roda Viva, pôde-se perceber a resistência de alguns dos entrevistadores às idéias sugeridas por Amit Goswami. Um dos entrevistado­res chegou mesmo a afirmar que Amit Goswami não é mais um físico. Contudo, Goswami acredita que a história da ciência se repetirá mais uma vez, e que o tem­po se incumbirá de trazer à tona a massiva verificação empírica dessas idéias:

"Eu acredito que as idéias se verificarão por si mesmas, serão confirmadas nos laboratórios e serão úteis.
A ciência tem dois critérios fundamentais.
Por isso Galileu é chamado de pai da ciência moderna, pois ele enunciou claramente esses dois critérios.
Um é que a ciência deve ser verificável.
Ela deve ser verificada experimentalmente.
E a segunda idéia é que a ciência deve ser útil.
No aspecto da verificação, já apresentei alguns experimentos a vocês, pois o tempo é curto, não entrarei em outros experimentos, mas digo que há um número enorme de experimentos sendo realizados, graças à parapsicologia e aos interessados em parapsicologia.
Mas também em biologia, e a medicina é uma grande área de verificação experimental de algumas de nossas idéias. Mas a questão da utilidade é a mais importante.
Deepak Chopra ficou famoso por um livro que escreveu chamado Cura Quântica, lançado há 10 anos. Ele começou a revolucionar a medicina, de certa forma, pois há um fenômeno chamado "efeito placebo" para o qual os cientistas não têm explicação.
E esse trabalho que é muito semelhante à minha forma de pensar, e eu tenho lido trabalhos citando a conexão entre as nossas idéias... Mas veja as implicações disso.
Se, de fato, houver cura quântica, se houver medicina mental, o efeito da mente sobre a cura, então as pessoas serão de fato ajudadas, não apenas no campo da psicologia, mas no campo da verdadeira saúde física.
A saúde física real, que importa para muito mais pessoas do que a saúde mental, ainda não estamos esclarecidos o bastante para levar a saúde mental tão a sério.
Mas todos se preocupam com a saúde física, levam muito a sério.
É a aplicação da nova ciência a essas áreas, especialmente na área da saúde, que vai trazer a revolução de que Deus é importante, a consciência é importante, a criatividade é importante, observar o livre-arbítrio e responsabilidade é importante, que temos um paradigma cientifico que pode unir todas essas coisas, trazê-las para junto da velha ciência e ter formas objetivas de proceder e prever.
Será uma ciência previsível, poderá ser verificada e também será útil.
Isso é o que mudará a percepção do público.
A percepção dos cientistas, também."


Por Adalberto Tripicchio 

Fonte:
rede psi portal

domingo, 22 de agosto de 2010

A Ponte entre Ciência e Religião Por Amit Goswami



Transcrição completa da entrevista concedida pelo físico Amit Goswami ao programa "Roda Viva" da TV Cultura, no dia 12/3/2001.

O Roda Viva entrevista o físico nuclear indiano AMIT GOSWAMI. Considerado um importante cientista da atualidade ele tem instigado os meios acadêmicos com sua busca de uma ponte entre a ciência e a espiritualidade. Amit Goswami vive nos Estados Unidos. É PHD em física quântica e professor titular de física da Universidade de Oregon. Há mais de quinze anos está envolvido em estudos que buscam construir o ponto de união entre a física quântica e a espiritualidade. Já foi rotulado de místico, pela comunidade científica, e acabou acalmando os críticos através de várias publicações técnicas a respeito de suas idéias. Em seu livro O Universo Autoconsciente - publicado no Brasil - ele procura demonstrar que o Universo é matematicamente inconsistente sem a existência de um conjunto superior - no caso, DEUS. E diz que, se esses estudos se desenvolverem, logo no início do terceiro milênio Deus será objeto de ciência e não mais de religião.

A bancada de entrevistadores será formada por Mário Sérgio Cortella, filósofo e dir.em educação, prof. do Depto. Teologia e ciências religião da Puc SP; Cláudio Renato Weber Abramo, jornalista e mestre em filosofia da ciência; Pierre Weil, educador e reitor da Universidade Holísitica Internacional de Brasília; Rose Marie Muraro, escritora e editora; Leonor Lia Beatriz Diskin Pawlowicz, jornalista e Pres.da Assoc. Palas Athena; Joel Sales Giglio, psiquiatra, ex chefe do Depto.de Psic. Médica e psquiatria da Unicamp, analista junguiano da Assoc. Junguiana do Brasil e membro da International Assossiation for Analitical Psychology; Carlos Ziller Camenietzki, físico, dr. em filosofia e pesquisador do Museu de Astronomia do Min. da Ciência e Tecnologia.

Heródoto Barbeiro: Dr. Amit Goswami, Boa Noite. Inicialmente eu gostaria que o senhor dissesse aos telespectadores da TV Cultura, que ao longo do século XX os cientistas estiveram ligados muito mais ao materialismo do que à religiosidade. A impressão que eu tenho é que nessa virada para o século XXI, essas coisas estão mudando. O senhor poderia nos explicar o porque dessa aproximação entre a ciência e a espiritualidade?

Amit Goswami: Com prazer. Esta mudança da ciência, de uma visão materialista para uma visão espiritualista, foi quase totalmente devida ao advento da Física Quântica. Ao mesmo tempo, houve algumas mudanças em Psicologia transpessoal, em Biologia evolucionista, e em medicina. Mas acho que é correto dizer que a revolução que a Física Quântica causou na Física, na virada do século, seria baseada nessas transições contínuas, não apenas movimento contínuo, mas também descontínuo. Não localidade. Não apenas transferência local de informações, mas transferência não-local de informações. E, finalmente, o conceito de causalidade descendente. É um conceito interessante, pois os físicos sempre acreditaram que a causalidade subia a partir da base: partículas elementares, átomos, para moléculas, para células, para cérebro. E o cérebro é tudo. O cérebro nos dá consciência, inteligência, todas essas coisas. Mas descobrimos, na Física Quântica que a consciência é necessária, o observador é necessário. É o observador que converte as ondas de possibilidades, os objetos quânticos, em eventos e objetos reais. Essa idéia de que a consciência é um produto do cérebro nos cria paradoxos. Em vez disso, cresceu a idéia de que é a consciência que também é causal. Assim, cresceu a idéia da causalidade descendente. Eu diria que a revolução que a Física Quântica trouxe, com três conceitos revolucionários, movimento descontínuo, interconectividade não-localizada e, finalmente, somando-se ao conceito de causalidade ascendente da ciência newtoniana normal, o conceito de causalidade descendente, a consciência escolhendo entre as possibilidades, o evento real. Esses são os três conceitos revolucionários. Então, se houver causalidade descendente, se pudermos identificar essa causalidade descendente como algo que está acima da visão materialista do mundo, então Deus tem um ponto de entrada. Agora sabemos como Deus, se quiser, a consciência, interage com o mundo: através da escolha das possibilidades quânticas.

Rose Marie Muraro: O que mais me espanta na Física é o problema da medição quântica de Heisemberg, que voce, realmente, acha que deve ter um observador olhando e que modifica a realidade, por exemplo, transforma a onda em partícula. Eu gostaria de saber... isso aí houve uma grande briga de Einstein com Niels Bohr. Eu gostaria de saber, em escala cósmica, onde não há observadores, se há um observador supremo, na sua opinião, e se ele cria matéria ou como se faz esse fenômeno?

Amit Goswami: Essa é a questão fundamental, Rose Marie, porque.. qual é o papel do observador? É a pergunta que abre a integração entre Física e espiritualidade. Na Física Quântica, por sete décadas, tentou-se negar o observador. De alguma forma, achava-se que a Física deveria ser objetiva. Se dessem um papel ao observador, a Física não seria mais objetiva. A famosa disputa entre Böhr e Einstein, a que se refere essa disputa, basicamente, sempre terminava com Bohr ganhando a discussão, mostrando que não há fenômeno no mundo a menos que ele seja registrado. Bohr não usou a consciência.. mas atualmente, vem crescendo o consenso, muito lentamente, de que a Física Quântica não está completa, a menos que concordemos que nenhum fenômeno é um fenômeno, a menos que seja registrado por um observador, na consciência de um observador. E isso se tornou a base da nova ciência. É a ciência que, aos poucos, mas com certeza, vem integrando os conceitos científicos e espirituais.

Cláudio Abramo: Em sua fala inicial, o senhor mencionou, deu como fato, que teria crescido a idéia de que haveria uma causalidade no sentido inverso àqueles do tradicional que se considera, e daí saltou para a afirmação de que isso abriria a porta para a entrada de Deus. A minha pergunta se divide em duas. Em primeiro lugar, essa idéia cresceu aonde? Quem, além do senhor, defende esse tipo de visão de mundo? E... dois, o porque Deus entrou aí nessa equação?

Amit Goswami: Na Física Quântica há um movimento contínuo. A Física Quântica prevê isso. Não há dúvida que a Matemática Quântica é muito capaz, muito competente, e ela prevê o desenvolvimento de ondas de possibilidades, a matéria é retratada como ondas de possibilidades. O modo como elas se espalham é totalmente previsto pela Física Quântica. Mas agora temos probabilidades de possibilidades. Nenhum evento real é previsto pela Física Quântica. Para conectar a Física Quântica a observações reais, embora não vejamos possibilidades e probabilidades, na verdade vemos realidades. Esse é o problema das medições quânticas. E luta-se com esse problema há décadas, como eu já disse, mas nenhuma solução materialista, uma solução mantida dentro da primazia da matéria foi bem sucedida. Por outro lado, se considerarmos que é a consciência que escolhe entre as possibilidades, teremos uma resposta, mas a resposta não é matemática. Teremos de sair da matemática. Não existe Matemática Quântica para este evento de mudança de possibilidades em eventos reais, que os físicos chamam de ‘colapso da onda de possibilidade em realidade’. É essa descontinuidade do colapso que nos obriga a buscar uma resposta fora da Física. O que é interessante é que se postularmos que a consciência, o observador, causa o colapso da onda de possibilidades, escolhendo a realidade que está ocorrendo, podemos fazer a pergunta: qual é a natureza da consciência? E encontraremos uma resposta surpreendente. Essa consciência que escolhe e causa o colapso da onda de possibilidades não é a consciência individual do observador. Em vez disso, é uma consciência cósmica. O observador não causa o colapso em um estado de consciência normal, mas em um estado de consciência anormal, no qual ele é parte da consciência cósmica. Isso é muito interessante. O que é a consciência cósmica diante do conceito de Deus, do qual os místicos e teólogos falam?

Mário Cortella: Uma questão para o doutor Amit que é a seguinte: o senhor é originado de uma cultura, que é a cultura da Índia, onde o hinduísmo, como religião, tem uma profusão de deuses ou de divindades, ou de deidades. Alguns chegam a falar em 300 milhões de deidades dentro da religião hindu. De outro lado, seu pai foi um guru brâmane, o senhor tem um irmão que é filósofo. Esta mescla de situações induziu no senhor uma compreensão em relação a um ponto de chegada, na religião, partindo da Física, ou o senhor já partiu da religião e, por isso, chegou até a Física e supõe que a Física Quântica é uma das formas de praticar teologia?

Amit Goswami: Obrigado pela pergunta, porque costumam me perguntar se minha formação como indiano hindu afeta o modo como pratico a Física. Na verdade, fui materialista por um bom tempo. Fui físico materialista dos 14 anos de idade até cerca de 45 anos. O materialismo foi importante para mim. Eu trabalhei com ele, filosofei nele, cresci nele. Eu obtive sucesso em Física dentro da Física materialista. Mas quando comecei a trabalhar no problema da medição quântica, eu realmente tentei resolvê-lo dentro do materialismo. Enquanto todos nós trabalhávamos, falei com muitos físicos que trabalhavam no problema (este é o problema mais estudado da Física, um dos mais estudados). E todos tentávamos resolver este paradoxo: se a consciência é um fenômeno cerebral, obedece à Física Quântica, como a observação consciente de um evento pode causar o colapso da onda de possibilidades levando ao evento real que estamos vendo? A consciência em si é uma possibilidade. Possibilidade não pode causar um colapso na possibilidade. Assim, eu tive de abandonar esse pensamento materialista. Embora fosse interessante, em minha vida pessoal eu sentia necessidade de mudar. Alguns consideraram uma transição de meia-idade, e os dois problemas, crescimento na vida pessoal e o problema da medição quântica, se confundiram, e eu comecei a ver a consciência não apenas como um problema físico, mas também como um problema pessoal. O que é que deixa alguém feliz? Qual é a natureza da consciência, da qual as pessoas falam quando se pensa além do materialismo? Então, comecei a meditar e a me aproximar de alguns místicos, e isso ajudou. E um dia, quando falava com um místico, e ele me dava a tradicional visão mística do mundo, que eu já ouvira muitas vezes antes, mas, de algum modo, essa conversa causou uma nova impressão em mim. Eu pude ver, eu realmente vi além do pensamento, tive a percepção de que a consciência é a base do ser, e essa percepção soluciona o problema da medição quântica. Não só isso: pode ser usada como base para a ciência. Normalmente, os cientistas presumem que a ciência deve ser objetiva, etc, mas eu vi, naquele momento, que a ciência deve ser objetiva até um certo ponto. Eu chamo de objetividade fraca, mas isso pode ser alcançado nessa nova Metafísica. Consciência é a base de todos os seres. Então, para mim, foi o contrário, eu fui da Física para a espiritualidade, sob o aspecto da Física. Porque minha formação espiritual, embora em retrospecto, eu possa dizer que foi saudável, deve ter sido, como Freud diria, no subconsciente. Mas conscientemente foi o oposto. Eu vim de uma questão muito inquietante, de como resolver um problema físico, um problema do mundo, pois esse é o problema mais importante do século XX. E a partir disso, esse salto conceitual, esse salto quântico perceptivo me fez reconhecer que o modo como espiritualistas vêem a consciência é o modo certo de ver a consciência. E esse modo de ver a consciência resolve o problema da medição quântica. Ele nos dá a base para uma nova ciência.

Carlos Ziller: Eu gostaria de fazer uma pergunta, dando um passo mais atrás no sentido da própria Física clássica. Porque nós sabemos, hoje em dia, que os fundadores da Física clássica, Newton, Déscartes e outros grandes cientistas do século XVII, para eles, para os projetos científicos que propunham, Deus era uma parte constitutiva inseparável do mundo que eles imaginavam, seja como sendo quem garantia a eficácia, eficiência, o funcionamento das leis do mundo, seja como alguém que operava os próprios fenômenos naturais. Bom, isso foi sendo afastado, expulso do mundo da ciência ao longo do século XVIII, século XIX, ou século XX, talvez, até os anos 50 tenha sido o ápice dessa questão, os cientistas, os físicos, sobretudo, não gostavam totalmente nada de falar sobre esse assunto. Deus era um problema. Talvez o seu estudo e a sua reflexão esteja tentando recolocar no seu próprio lugar, pelo menos foi assim que eu interpretei, algumas idéias do próprio século XVII, dos fundadores da ciência moderna. Eu gostaria de saber se essa aproximação do Deus do Newton, o que garantia que as leis naturais funcionavam, se esse Deus tem algum paralelo com a consciência, supra-consciência que o senhor propõe como sendo o princípio a partir do qual os fenômenos do mundo, a realidade estaria constituída?

Amit Goswami: É uma pergunta muito boa. Os conceitos da Física clássica, no início, não separavam Deus, como disse, mas então, aos poucos, descobriu-se que Deus não era necessário. Depois que Deus estabeleceu o movimento do mundo, ele passou a ser guardião de seu jardim, e isso é o que a maioria dos físicos clássicos pode fazer. Mas na Física Quântica, há o problema da medição. Como as possibilidades tornam-se eventos reais, temos espaço para uma consciência, e ela deve ser uma consciência cósmica. Há uma semelhança com o modo como Deus é retratado, pelo menos na subespiritualidade tradicional, não na mente popular. A mente popular considera Deus um imperador, um super-humano sentado no céu. Essa imagem de Deus não é científica, e espero que esteja claro que não estamos falando em Deus dessa forma, mas Deus nessa consciência mais cósmica, nessa forma mais estrutural. Esse tipo de Deus está retornando porque, se voce se recorda, o debate entre teólogos e cientistas sempre foi: Deus é o guardião ou Deus intervém? Teólogos afirmam que Deus intervém nos seres biológicos. E então surgiu Darwin. Foi um grande golpe nos teólogos, porque antes, apesar de Newton, os teólogos podiam citar o exemplo da Biologia, cujo propósito é muito óbvio, pelo menos, óbvio para a maioria. Mas a teoria de Darwin foi um golpe porque se dizia que a evolução ocorria... mas ela era natural? Darwin disse que ela era natural. Oportunidade e necessidade. Não há necessidade de Deus na evolução e não há necessidade de Deus na biologia. Então, no século XX, surgiu o behaviorismo e a idéia de que temos livre-arbítrio subjetivo. Essa idéia também foi superada, porque experimentos mostraram que somos muito condicionados, não há livre-arbítrio. Contra tudo isso, vejam só, a Física Quântica também cresceu ao mesmo tempo que o behaviorismo, e a Física Quântica tem uma coisa peculiar: o princípio da incerteza. O mundo não está determinado como imaginamos. Deus não é o guardião. O princípio da incerteza levou à onda de possibilidades, depois o colapso da onda de possibilidades para a introdução da idéia do colapso da consciência. Paradoxalmente, fomos criados contra essa idéia, mas nos anos 90, eu, Henry Stab, Fred Allan Wolf, Nick Herbert, todos mostramos que esse paradoxo pode ser resolvido. Não há paradoxo se presumirmos que a consciência que causa o colapso da onda de possibilidades em eventos reais é uma consciência cósmica. E o evento do colapso em si nos dá a separação matéria-objeto do mundo. Assim, não só resolvemos o problema da medição quântica como também demos uma nova resposta de como a consciência de um torna-se várias. Como ela se divide em matérias e objetos, para poder ver a si mesma. E essa idéia de que o mundo é um jogo da consciência, um jogo de Deus, que é uma idéia muito mística, voltou à tona. Então, podemos voltar à biologia. Deus intervém na biologia? Deus intervém na vida das pessoas? Essas perguntas continuam tendo respostas muito positivas. Vi, em um jornal sobre Biologia evolucionista, que há muitos furos conhecidos na teoria darwiniana. Esses furos são chamados sinais de pontuação. A teoria da evolução de Darwin explica alguns estágios homeostáticos da evolução, ou seja, como as espécies adaptam-se a mudanças ambientais. Mas não explica como uma espécie torna-se outra. Essa especiação, mudança de uma espécie em outra, é uma nova mudança na evolução, não está na teoria de Darwin. Experimentalmente, isso é demonstrado em lacunas de fósseis. Não temos uma continuidade de fósseis mostrando como um réptil tornou-se um pássaro. A idéia é que sejam sinais de pontuação, estágios muito rápidos de evolução. Eu sugiro que isto seja um salto quântico, um salto quântico na evolução. Nesse salto quântico, a consciência interveio, não de um modo subjetivo, de um modo caprichoso, mas de um modo muito objetivo.. muito objetivo, e essas idéias objetivas ficam claras com o trabalho de Rupert Sheldrake e outros, o modo como isso pode ser objetivo. Mas, sem dúvida alguma, há uma intervenção da causalidade descendente. Não se pode explicar a Biologia evolucionista só com a causalidade ascendente. Essa é a coisa mais interessante, a partir do pensamento original dos físicos de que Deus deve ser o guardião, pois tudo pode ser explicado e tudo é determinado, que não precisamos de Deus. Agora, estamos fechando o círculo, e vemos que não só precisamos de Deus: há movimentos descontínuos no mundo para os quais não existe explicação matemática ou lógica. Ainda assim, é totalmente objetivo, não é arbitrário. Deus age de forma objetiva, bem definida. A consciência cósmica não é subjetiva, não é a consciência individual que afeta o mundo. Isso ocorre de forma cósmica, podemos discutir objetivamente. A ciência detém seu poder, sua objetividade e, ainda assim, temos agora a descontinuidade, temos a interconectividade e podemos falar sobre vários assuntos dos quais os místicos tradicionalmente falam.

Pierre Weil: Durante essa discussão eu me coloquei como educador do ponto de vista do telespectador, e estou um pouco com medo de que alguns já desligaram o aparelho diante do alto nível científico do debate, que é necessário e indispensável. Eu queria ressaltar a importância da sua presença aqui em termos mais simples. Para o telespectador... tem telespectadores que acreditam em Deus, acreditam em espiritualidade e tem outros que não acreditam em Deus, não acreditam... são os materialistas versus os espiritualistas. Entre os dois têm os que não sabem ou os que nem se interessem para isto. Nestas três categorias, a sua presença aqui tem uma importância muito grande. Ela tem uma importância porque nesse século que passou, nós estivemos assistindo a três grandes movimentos: o primeiro movimento, em que muitos espiritualistas, muitas pessoas que acreditavam em Deus, abalados pelas “provas”, pelas evidências da ciência, largaram a religião e só acreditaram na matéria. E nisso foram até muitos sacerdotes de várias religiões. Largaram a batina, largaram a sua fé e se transformaram em protagonistas do materialismo. Estamos assistindo, atualmente, a um movimento contrário. Eu tenho, por exemplo, dois amigos meus. Um, Matew, grande biólogo francês, largou a biologia e hoje ele é monge budista tibetano. O outro era astrofísico, colega seu, largou a astrofísica e hoje ele é rabino. Então estamos assistindo a um movimento contrário. A sua presença aqui apresenta uma terceira saída, e que me parece a mais conveniente e a mais razoável, a mais holística, que é a minha também. A sua, como Física Quântica, fez com que, vindo do materialismo, não caísse no extremo do espiritualismo, mas integrou os dois. Eu fiz isso também como psicólogo, através da psicologia transpessoal... o senhor através da Física Quântica, eu, através da Psicologia Transpessoal... e nos encontramos muito bem e nos abraçamos o tempo todo. A minha pergunta é uma pergunta pessoal: poderia contar para os telespectadores, em termos mais simples, o que fez com que Amit Goswami ficasse no meio do caminho e fizesse um encontro dentro dele, da razão da Física, da razão materialista, e do outro lado, da Intuição? Falou nos seus amigos místicos, mas pela minha experiência eu sei que a segurança pela qual eu falo, não é apenas racional, ela é baseada numa experiência chamada interior, chamada subjetiva, chame como quiser, de luz, e de saber mais ou menos como que é esse mundo espiritual. Qual é a sua experiência que fez com que unisse, na sua pessoa, o lado masculino, racional, e o lado feminino, intuitivo, sentimental? O que aconteceu com a sua pessoa? Eu acho que isso nos vai reconciliar com os telespectadores.

Amit Goswami: Sim, obrigado. Esta é a questão fundamental. Às vezes, eu digo que todos nós, todas as pessoas, espectadores, cientistas, o orador, todos aqui, todos nós temos dois lados. Um é semelhante a Newton, que quer entender tudo em termos de objetividades, ciências e matemática, e o outro é William Blake, que é místico e ouve diretamente, intuitivamente, e desenvolve seu retrato do mundo baseado nessa percepção intuitiva. O que ocorre nessa integração, o que ocorreu por um tempo, mesmo antes de essa integração começar, é que começamos a entender a natureza da criatividade. E a falsa idéia de que cientistas só trabalham com idéias racionais e matemáticas, está, aos poucos, caindo. Einstein disse isso muito claramente: “Não descobri a Teoria da Relatividade apenas com o pensamento racional”. As pessoas não levam a sério tais declarações. Mas Einstein falou sério. Ele sabia que a criatividade era importante. Agora, quase cem anos de pesquisas sobre criatividade estão mostrando que os cientistas também dependem da intuição. Eles também dependem de visões criativas para desenvolver sua ciência. Nem tudo é racional, matemático; nem tudo é pensamento racional. Voce perguntou sobre minha experiência pessoal. Eu já compartilhei a experiência fundamental pessoal que tive quando troquei... nem devo dizer que troquei, eu tive uma percepção. Não posso descrevê-la em termos de espaço-tempo. Eu estava fora do espaço-tempo, experimentando diretamente a consciência como a base do ser. É esse tipo de experiência que dá a base para ficarmos convencidos, para termos certeza de que a realidade é algo mais do que o espaço-tempo no mundo em movimento faz parecer. Este é o escopo fundamental para o ponto de encontro dos cientistas e espiritualistas. Porque os espiritualistas ouviram esse chamado, essa intuição, muito antes. Os cientistas também a ouviram. Mas por eles sempre expressarem suas percepções em termos de lógica, em termos de razão, isso ocorre mais tarde. Eles esquecem a origem de seu trabalho, a origem de sua percepção. Já para os espiritualistas, a percepção leva à transformação do modo de vida. Assim, eles nunca esquecem que foi a intuição que trouxe a felicidade, foi ela que os fez quem são. Essa é a diferença. Cientistas usam a intuição para desenvolver sistemas que estão fora deles, o que chamo de criatividade externa. E isso torna-se uma camuflagem dos verdadeiros mecanismos do mundo para eles. Enquanto espiritualistas mantêm-se com a percepção, mudam suas vidas, e incidentalmente, mudam o mundo externo. Mas eles sabem que aquela percepção que tiveram é a coisa fundamental que gere o mundo. Para eles, a consciência é cósmica, isto é algo determinado. Para os cientistas, a mesma descoberta é possível, mas eles ignoram o chamado e prestam mais atenção ao que ocorre no cenário externo. Acho que, se todos nós compartilharmos isso, o mundo poderá mudar. Agradeço pela pergunta. Estou disposto a compartilhar: escrevi um livro sobre criatividade, no qual conto minhas histórias pessoais. Em todos os meus livros conto minhas histórias pessoais. É importante compartilharmos nossas histórias pessoais, e acabar com o mito de que os cientistas são apenas pensadores racionais. Eles também têm percepções que vão muito além do pensamento racional.

Heródoto Barbeiro: Doutor Goswami, o senhor falou muito em Deus durante a primeira parte deste programa, e aqui no ocidente, quando se fala em Deus, se imagina que exista o seu contraponto. E aqui no ocidente se dá uma série de nomes a ele. Eu gostaria de saber como é que o senhor explica essa... se o senhor concebe a existência desse contraponto, dessas outras forças que não são necessariamente Deus.

Amit Goswami: Essa questão de Deus contra o Mal é interessante. Segundo a visão da Física Quântica, existem as forças da criatividade e as forças do condicionamento. Não falamos muito sobre isso, mas eu defendo a idéia que a Física Quântica nos dá, de que é a consciência cósmica que escolhe entre as possibilidades para trazer à realidade o evento real que ocorre. A questão é: então temos de entrar nesse estado incomum de consciência, no qual somos cósmicos, no qual escolhemos e, então... como entrar nessa consciência individual na qual somos uma pessoa? Na qual temos personalidade e caráter? Ao trabalharmos com a matemática disso, descobrimos que essa condição ocorre porque todas as nossas experiências aparecem após serem refletidas no espelho da nossa memória, muitas vezes. É essa memória que causa o condicionamento. Uma propensão a agir do modo como já agi antes. Uma propensão para responder a estímulos do modo como já respondi antes. Todas as pessoas sabem disso. Elas passam a manhã no cabeleireiro e o marido volta para casa e diz: “O que há para o almoço?”, sem notar o novo penteado da esposa, o que é muito irritante, tenho certeza. Mas esse condicionamento é o que nos torna indivíduos. Então, a questão é que, na Física Quântica, vemos claramente o papel da consciência cósmica, que eu chamo de “ser quântico”, no qual há criatividade, há forças criativas. E então perdemos essa criatividade, ficamos condicionados. E o condicionamento nos faz parecidos com máquinas. Assim, o mal maior que a nova ciência nos traz é o condicionamento. Pois é ele que nos faz esquecer a divindade que temos, o poder criativo que temos, a força criativa que realmente representa o que buscamos quando invocamos Deus. Mas isso também está incompleto. Essa questão pode ser estudada mais a fundo e há um escopo maior, trazendo idéias como emoções negativas e positivas. Assim, teremos uma exposição maior do Bem contra o Mal. Mas, de fato, a consciência cósmica inclui tudo. Esse é o conceito esotérico, não tanto exotérico, mas esotérico, por trás de todas as religiões, de que há apenas Deus, e que o Bem e o Mal são uma divisão, uma necessidade da criação, mas não é fundamental, ou seja, o diabo não é igual a Deus; o diabo é uma criação subsequente. É útil pensarmos em termos de Bem e Mal mas, às vezes, é preciso transcender isso, é preciso perceber que Deus é tudo. Esse é o cenário que a Física Quântica defende.

Joel Giglio: Doutor Amit, eu sou psiquiatra, analista Junguiano, formado pela Associação Junguiana do Brasil, e tenho muitas perguntas a fazer ao senhor. Mas em vista do tempo e dos objetivos desse programa, vou me centrar numa delas. Eu pensei muito, quando li seu livro, em questões que ainda são incógnitas à nossa prática psicoterápica. A
questão do ‘insight’... O ‘insight’ nós não sabemos, em psicoterapia, quando ele vai acontecer, como vai acontecer. Ele simplesmente aparece e quase que do nada, embora a gente intua que o ‘insight’ vá aparecer. A questão da criatividade... a questão da sincronicidade... mas eu gostaria de fazer uma questão sobre os arquétipos. O senhor menciona no seu livro, idéias de arquétipos de objetos mentais. Cita Platão e cita Jung, que é o criador da psicologia analítica, setor da psicologia onde eu me situo. A questão que tem me perturbado muito é: os arquétipos evoluem, embora eles estejam fora do eixo espaço-tempo? Alguns autores dizem que está havendo uma evolução dos arquétipos. Quem fala isso, por exemplo, é Sheldrake, que o senhor mencionou há pouco e que não é psicólogo, é biólogo, mas que tem uma visão diferente dentro do campo da biologia. Como é que a teoria da Física Quântica explicaria, supondo que os arquétipos evoluem, a evolução dos próprios pensamentos arquetípicos, por exemplo, a evolução do arquétipo de Deus, se é que ele está evoluindo ou não. Essa questão... e muitos outros arquétipos, nós supomos que estejam evoluindo sem anularem os arquétipos anteriores.

Amit Goswami: Obrigado pela pergunta. Sou um grande seguidor de Jung. Acho que Jung foi dos precursores da integração que está ocorrendo agora. Nos meus primeiros textos, eu citava muito a afirmação de Jung de que, um dia, a Física Nuclear e a Psicologia se unirão. E acho que Jung ficaria satisfeito com esta conversa e, em geral, com a integração da Física e da Psicologia transpessoal que vemos hoje. Isto posto, acredito no conceito de arquétipo de Jung, e acho que o modo como Jung o apresentou, e Platão o apresentou, de que são aspectos eternos da consciência, contextos eternos da consciência... a consciência tem um corpo contextual no qual os arquétipos são definidos e, então, eles governam o movimento do nosso pensamento. Acho que é um conceito muito poderoso. Mas, ao mesmo tempo, na Física Quântica, existe a idéia de que todos os corpos de consciência, tudo o que pertence à consciência, inconsciência, são possibilidades. E por causa disso, por tudo ser possibilidade, surge a questão: alguém pode ir além de arquétipos fixos e considerar arquétipos evolucionistas? Não se pode descartar o que Rupert tenta dizer. Houve uma idéia semelhante, de Brian Josephson, um físico que publicou um trabalho na Physical Review Letters, revista de grande prestígio, dizendo que as leis da Física podem estar evoluindo. Da mesma forma, outras pessoas, cientistas muito sérios, sugeriram que, talvez, forças gravitacionais mudem com o tempo. Essa idéia de arquétipos fixos é uma idéia muito importante. Eu a apóio totalmente. Mas também vejo que na Física Quântica há espaço para a evolução dos arquétipos. Não devemos descartar totalmente idéias que dizem que arquétipos evoluíram. Ainda seremos capazes de determinar isso experimentalmente. Obrigado pela pergunta.

Lia Diskin: O senhor manifesta certo interesse pelas questões éticas, grande parte do final de sua obra se dedica a essa questão. O senhor nos disse que há necessidade da participação da ambiguidade para dar garantias de criatividade no campo ético. Entretanto, no mesmo contexto, nos fala imediatamente das linhas e instruções éticas numa obra monumental da tradição indiana que se chama “Bhagavad Gitâ”. E a “Bhagavad Gitâ” se inicia pelo pressuposto da instrução do mestre para um discípulo, de que ele deve agir, de que ele deve entrar no combate, que ele deve assumir sua parte de ação, porque pertence a uma casta, a uma tradição de guerreiros, em que há ação da própria. Como fica o livre-arbítrio, como fica a ambiguidade como necessidade da criatividade dentro de um contexto de que existe um pressuposto, obviamente não-ambíguo e não-escolhível, que não pôde escolher? O que fazer... mas se está cominado a fazer, está cominado a agir? Como será isso, Professor?

Amit Goswami: Acho que essa também é uma pergunta muito difícil, muito sutil. Realmente, se considerarmos a ética compulsória, não parece haver escolha. Mas a ética não é tão definida: é muito ambígua. Lembro de uma história que o grande filósofo Jean-Paul Sartre contava. Suponha que voce vá em uma expedição de natação, ou melhor, de barco, e o barco afunde. Voce está com um amigo, voce sabe nadar, mas ele não. Mas voce não é muito forte. Se tentar salvá-lo, os dois podem morrer. Voce tem uma boa chance de se salvar, mas ama seu amigo e seu dever ético com ele está muito claro. O que fazer? Casos assim mostram claramente que há ambiguidade mesmo em decisões éticas, em decisões morais. Na Física Quântica, é muito claro que devemos esperar, e esperar pela intuição, ver se há um salto quântico, uma resposta criativa como voce a chama, se uma resposta criativa irá surgir. E é essa resposta criativa que é a resposta correta para solucionar essa ambigüidade em questões éticas. Quando a moralidade ou a ética são apresentadas como um conjunto de regras, e as pessoas seguem essas regras, elas perdem essa parte ambígua e, por causa disso, as regras perdem o sentido. Passa a ser um conjunto de regras inútil, sem vida. Mas, se considerarmos a ética com vida, e reconhecermos que temos um papel a desempenhar em todas as situações éticas, temos um papel a desempenhar em termos de irmos para dentro de nós, como as pessoas criativas fazem, combatendo isso, combatendo a ambiguidade. Então, o salto quântico da percepção virá e vai-nos permitir tomar a ação correta. É nisso que a Física Quântica está nos ajudando, é nessa conclusão que ela está nos ajudando. E acho que Sartre também buscava essa resposta porque a ética fixa é uma coisa impossível de se seguir.

Cláudio Abramo: Eu vou, infelizmente, ter que me estender ligeiramente na minha pergunta. Ela é precedida de uma declaração... Vou fazer uma interpretação do que foi declarado até agora, que eu acho que deve ser útil para os telespectadores. Não estou fazendo isso para me expor, mas para esclarecer o que me parece ser algumas questões importantes nesse debate para o telespectador. O entrevistado faz menção a fenômenos inexplicados, a fenômenos desviantes, entre diversas disciplinas. Começa com a Física, passa pela Biologia, faz referência a problemas seculares com respeito à consciência humana, ao livre-arbítrio, ao modo como raciocinamos, ao modo como chegamos a conclusões, menciona casos como, por exemplo, Einstein declarando, como tantos outros cientistas, que não sabe muito bem como chegou a uma conclusão. Poincaré, antes dele, havia escrito muito sobre isso... Poincaré era uma matemático, o último grande matemático universalista francês... ele morreu no começo desse século (XX). Bom, esse tipo de anedota é completamente comum na ciência. Não há nenhuma originalidade nisso. Esse gênero de anedota, repito, fenômenos inexplicados que são característicos da ciência... a ciência quanto mais sabe, menos sabe... quanto mais a ciência sabe, quanto mais fenômenos são explicados, mais avenidas de desconhecimento se abrem. Um cientista diz “não sei” o tempo todo. Um não-cientista explica tudo, porque sempre tem uma resposta do tipo “todo abrangente” como é esta resposta. O fato de se ter isso, para os telespectadores entenderem, o fato de se formular uma pseudo-explicação a respeito de como o universo funciona não dá a essa explicação, foros de verdade. Simplesmente declarar coisas não confere verdade ao que se declara. Agora, no que o senhor declara existe uma característica que eu acho bastante preocupante, ou pelo menos intrigante, vinda de alguém conhecido aqui como Físico, como o senhor declarou... o senhor foi.. o senhor foi Físico. O senhor diz, em primeiro lugar, que aquilo que seria essa intervenção de uma consciência cósmica, não é matematizável, quer dizer, isto não é introdutível dentro da teoria física na forma como a teoria física aceita as suas idéias. Não existe outra maneira de introduzir na Física idéias senão a matemática. Não existe.. não é possível, não é Física... se é não-matematizável, não é Física. Muito bem, então esta idéia de consciência cósmica não é Física, quer dizer, certamente nenhum Físico aceitará isso. Em segundo lugar, ela também, já que se está falando de alguma coisa que existe no mundo, que é uma consciência cósmica que se reflete na consciência das pessoas e faz as pessoas fazerem saltos quânticos... o senhor não vai usar esse termo, mas saltos quânticos em direção à solução de problemas... onde é que estão as evidências empíricas disso? Onde estão as experiências que levam a esse tipo de conclusão? Porque ou a gente pode ter conhecimento do mundo que seja muito estruturado, como no caso da Física, ou conhecimento do mundo pouco estruturado. Não existe uma teoria, não existe um conjunto de idéias muito organizado por trás, mas sabemos empiricamente que são verdadeiras, ou parecem verdadeiras. Onde é que estão as evidências empíricas e onde está o raciocínio, eu diria, desculpe a palavra, científico, que o leva a declarar que existiria uma consciência cósmica que estaria governando tudo e resolvendo todos os problemas aqui, da Biologia, da Psicologia?... O senhor afirma que estas suas idéias explicariam o problema da biologia evolucionista dos ‘gaps’ na criação de espécies, por exemplo. O senhor não acha ambicioso demais e, repito, onde é que estão as evidências empíricas disso?

Amit Goswami: Boa pergunta. Pergunta muito boa. Precisamos sempre fazer esta pergunta: onde está a evidência? Falarei da evidência mais tarde. Antes, responderei à pergunta: a Física é matemática? Ela deve ser totalmente matemática? Essa é uma crença que cresceu gradualmente na Física, por causa do sucesso da matemática para expressar a Física. Há duas coisas que devemos lembrar. Primeiro: não há motivo para a Física ser matemática. Às vezes os filósofos levantam essa questão. Nancy Cartwright escreveu um livro: Why do laws of Physics lie. Ela estava argumentando que não há provas dentro da filosofia materialista de que a Matemática deve governar as leis da Física. De onde vem a Matemática? Pessoas como Richard Feynman, grande físico, Eugene Bigner, todos estudaram a questão. E não há resposta dentro da filosofia materialista. Platão tem uma resposta: a matemática molda a Física porque surgiu antes da Física, faz parte do mundo arquetípico que discutimos. Assim, o idealismo de Platão é fundamental para entender o papel da Matemática na Física, em primeiro lugar. A Física em si precisa de algo além da matéria, ou seja, da matemática e de arquétipos para ser uma ciência consistente. É preciso se lembrar disso. O segundo aspecto da questão é o mais importante. Na Física Quântica, procuramos insistentemente uma forma matemática de encerrar a Mecânica Quântica. Uma forma matemática para entender a medição quântica. Não fomos capazes. Niels Bohr demonstrou para Erwin Schrödinger, há muito tempo, quando a Mecânica Quântica estava sendo desenvolvida. Schrödinger achou que tinha obtido a continuidade e Bohr provou o contrário e o convenceu disso. E Schrödinger disse: “Se eu soubesse que essa descontinuidade, saltos quânticos, iriam permanecer, eu nunca teria descoberto a Mecânica Quântica”. Bohr disse: “Estamos felizes que tenha descoberto”. Essas descontinuidades vão continuar existindo, não há explicação matemática, e por não haver explicação matemática, portanto, há espaço para o livre-arbítrio. O livre-arbítrio, Deus, consciência, colapso, tudo isso entrou para a Física porque atingimos o conhecimento, a sabedoria, de que existe o princípio da incerteza, existem a probabilidade e possibilidades. E por existirem probabilidade e possibilidades, deve haver um agente que causa o colapso das possibilidades em eventos reais. E esse agente não pode ser matemático porque, se for, não poderá haver livre-arbítrio: seria determinista. Mas não é determinista. O princípio da incerteza é fundamental. Assim, nós chegamos à conclusão, após décadas de lutas nós conseguimos...

Cláudio Abramo: Quem é “nós”?

Amit Goswami: “Nós” quer dizer que há um consenso entre cientistas...

Cláudio Abramo: Há um consenso a respeito de suas idéias?

Amit Goswami: Não a respeito de minhas idéias. Esqueça as minhas idéias. Mas há um consenso de que não há solução matemática para o problema da medição quântica. Nisso, chegamos a um consenso. E por não haver uma solução matemática para isso, e por haver uma solução consistente em termos de consciência causando colapso de possibilidades quânticas em realidade, podemos falar sobre essas idéias publicamente. Quanto à segunda pergunta: Há evidência empírica? Acontece que os dois aspectos fundamentais da nova física, a consciência causa o colapso da possibilidade em realidade, e o segundo, que essa consciência é uma consciência cósmica, os dois aspectos foram confirmados por dados empíricos. Antes, darei os dados para o segundo, porque é o mais simples para o espectador. O primeiro é um pouco difícil. Talvez possamos incluir os dois. O primeiro experimento é muito importante porque já foi aplicado. Em 1993 e 1994, o neurofisiologista mexicano Jacobo Greenberg Silberman, ele e seus colaboradores fizeram um experimento, no qual havia dois observadores meditando por 20 minutos, com o propósito de terem comunicação direta. Comunicação direta no estilo de não-localidade. Sinais não-locais ocorrendo entre eles, e ainda assim eles teriam comunicação. Certo, eles meditaram juntos. Pediu-se que mantivessem o estado meditativo durante o resto do experimento. Mas então, um deles é levado para outro recinto. Eles ficam em câmaras de Faraday, onde não é possível a comunicação eletromagnética. Os cérebros deles são monitorados. Uma das pessoas vê uma série de ‘flashes’ brilhantes, o cérebro dele responde com atividade elétrica, obtém-se o potencial de resposta muito claro, picos muito claros, fases muito claras. O cérebro da outra pessoa mostra atividade, a partir da qual obtém-se um potencial de transferência que é muito semelhante em força e 70% idêntico em fases ao potencial de resposta da primeira pessoa. O mais interessante é que, se voce pegar duas outras pessoas, duas pessoas que não meditaram juntas, ou pessoas que não tinham a intenção de se comunicar, para elas, não há potencial de transferência. Mas para pessoas que meditam juntas, invariavelmente, muitas vezes, um em cada quatro casos, obtemos o fenômeno de potencial de transferência. E Peter Fenwick, na Inglaterra, há dois anos, confirmou isso, repetindo o experimento. Assim, temos evidência empírica. Se tivéssemos tempo, e voce tivesse paciência, eu poderia lhe dar inúmeros dados. Outro dado que é muito interessante: considere o caso de geradores de números aleatórios. Eles são realmente aparelhos quânticos, pois eles pegam eventos radiativos, que são aleatórios, e os convertem em seqüências de números, seqüências de zeros e uns. Em uma longa cadeia, deve haver número igual de zeros e uns. É o que se espera da sequência aleatória. Helmut Schmidt, um físico que pesquisa parapsicologia, tenta há quase 20 anos, fazer com que médiuns influenciem os geradores de números aleatórios para gerarem sequências não-aleatórias, mais zeros que uns. E ao longo dos anos ele conseguiu boas evidências de que, até certo ponto, os médiuns conseguem fazer isso. Um resultado com um grande desvio. Isso ainda não tem nada a ver com Física Quântica, mas recentemente, em um trabalho publicado em 1993, Schmidt retratou uma modificação revolucionária desses dados. O que ele fez, recentemente, é que o gerador de números aleatórios, os dados do gerador de números, a sequência, é armazenada num computador, ela é impressa, mas ninguém olha. Os dados impressos são fechados num envelope e enviados para um observador independente. Três meses depois, o observador, sem abrir o envelope, escolhe o que quer ver, mais zeros ou mais uns. Tudo segue um critério. Então ele liga para o pesquisador, o pesquisador diz ao médium para olhar os dados, e pede a ele para mudar os resultados, influenciá-los, se puder. E o médium tenta produzir mais zeros, se esse for o desejo do observador. E então, o observador abre o envelope e verifica se o médium conseguiu. E a incrível conclusão é (é um resultado sério, não é fácil contestá-lo) que o médium, em 4 de cada 5 tentativas, consegue mudar os números aleatórios gerados pelo aparelho, mesmo após três meses. Este mito de que o pensamento causa o colapso de si mesmo, que o colapso é objetivo, sem que o observador consciente as veja, é apenas um mito. Nada acontece, tudo é uma possibilidade até que o observador consciente veja. Numa experiência controlada, as pessoas intervieram. As pessoas viram, sem contar a ninguém, viram os dados, a impressão. Nesses casos, o médium não influenciou os dados. Está claro que a consciência exerce um efeito, exatamente como Bohr suspeitava, como Newman suspeitava. Agora estamos fazendo teorias mais completas e experimentos mais completos baseados nessas teorias. Henry Stab colaborou com todas essas idéias que apresentei, consciência causando o colapso de funções quânticas em eventos reais. Ele participou do experimento com Schmidt. Então, estamos vendo uma mudança revolucionária na Física, não menos revolucionária do que a acontecida com Copérnico. Claro que haverá reações, como a que apresentou, e temos de ser muito pacientes, calmos, e trabalharmos juntos para superar essas tendências contrárias. Mas temos a certeza de que existe algo que todos devemos olhar. Isso é revolucionário, é novo e pode mudar, como já discutimos, as dificuldades com valores que a sociedade vem enfrentando. Não vamos nos preocupar em como pode ser, mas vamos olhar os dados, olhar a teoria e perguntar: pode ser? Se pode, que oportunidade fantástica temos para integrar todos esses movimentos díspares de consciência que nos separaram por tanto tempo.

Heródoto Barbeiro: Ele é autor também do livro “O universo autoconsciente -Como a consciência cria o mundo material”. Dr. Goswami, dentro dessas explicações que o senhor nos deu até agora, como fica a questão da reencarnação e da preservação dessa consciência dos seres humanos?

Amit Goswami: A questão da reencarnação, provavelmente, é a pergunta mais radical que pode ser feita. E é impressionante que a Física Quântica nos permita dar uma resposta afirmativa. Eu mesmo fiquei tão surpreso quanto qualquer um, com isto.. No início, quando me perguntavam isso, eu me recusava a discutir. Mas então, eu acordei de um sonho, e, basicamente, o sonho me dizia... eu ouvi isso no sonho: “O Livro Tibetano dos Mortos está certo e seu trabalho é provar”. Após acordar desse sonho, eu passei a encarar reencarnação com seriedade. Basicamente, o problema com a reencarnação é este: o corpo físico morre, e o que resta? Se a consciência é a base do ser, vem a idéia de que o que resta é a consciência. É a primeira pista. A segunda pista é que tudo é possibilidade, no modo quântico de ver as coisas. Então, não é irrelevante dizer que as possibilidades podem viver. Algumas possibilidades morrem com o corpo material e o cérebro, mas pode haver outras possibilidades, outras possibilidades que se modificam ao longo da nossa vida, e essas modificações das probabilidades das possibilidades podem formar uma confluência que possa viver mais tarde na vida de outra pessoa. É essa idéia que pude desenvolver de forma mais completa, num livro que será lançado no ano que vem, e fico feliz em dizer que podemos lidar com essa questão. A vantagem de se fazerem essas perguntas é que podemos ver imediatamente a utilidade das novas ciências que virão. Porque são essas coisas que preocupam as pessoas. As pessoas são fundamentalmente incomodadas por perguntas como “o que acontecerá quando eu morrer?”. E se a nova Física puder responder essas perguntas, a despeito da importância da Psicologia transpessoal, e da Psicologia junguiana, em que a nova ciência ajuda, e também da medicina alternativa, que nem discutimos ainda, acho que tocaremos o coração das pessoas quando pudermos dizer: “Finalmente, a Ciência pode ajudar a entender essa pergunta”. Até agora, apenas o padre, o teólogo pode dar qualquer resposta para a pessoa. E se pudermos dizer a ela: “Faz sentido fazer essa pergunta, e voce pode fazer algo para ajudar voce com o que acontecerá após a morte”. Não seria um progresso maravilhoso na ciência?

Joel Giglio: Professor Amit, eu vou fazer uma pergunta baseado no trabalho de um ex-orientando de tese de doutoramento que eu orientei na Universidade de Campinas, e que fez a primeira tese, pelo menos na Unicamp, e talvez em qualquer universidade estadual ou federal do Brasil, sobre parapsicologia. Ele fez uma tese sobre clarividência e eu não vou, naturalmente, falar da metodologia do trabalho que seria bastante extensa, mas resumir pelo menos os resultados principais. Várias pessoas, vários sujeitos tentavam adivinhar as cartas de um baralho de símbolos geométricos, baralho de Zener muito usado em pesquisa e parapsicologia, e tentava adivinhar as cartas de um baralho Tarô, que é baseado em imagens arquetípicas, o Rei, a Rainha, etc. Nos resultados que foram feitos seguindo uma metodologia tradicional, estatística, as pessoas acertaram, no baralho de Zener, um pouquinho acima do que era esperado ao acaso e 10% acima no baralho de Tarô, comparando com o de Zener. A explicação dada pelo meu orientando foi dentro da teoria da Psicologia Analítica, em relação aos arquétipos emergentes que, de uma certa forma, estariam mobilizados mais no baralho de Tarô do que simplesmente no baralho de símbolos geométricos. Mas essa explicação, embora nos satisfaça um pouco, ainda deixa muito a desejar. Eu perguntaria se o senhor teria alguma explicação a mais baseada na Teoria Quântica sobre essa maior adivinhação das cartas do baralho do Tarô, que são símbolos arquetípicos em relação ao baralho comum de Zener , que são cinco símbolos geométricos, quadrado, círculo, etc.?

Amit Goswami: Sim. Obrigado pela pergunta. Na verdade, somente no Brasil alguém pensaria em fazer um experimento tão brilhante. Tenho visitado o Brasil nos últimos 5 anos e o futuro parece promissor. Eu fico entusiasmado com a mente do brasileiro. Qual é a diferença entre o experimento original de adivinhação de cartas e as cartas de Tarô? A idéia que proponho, acho que voce pensa da mesma forma, é que quando o objeto que usamos na telepatia é significativo, ele é um objeto melhor. Os cientistas, os parapsicólogos anteriores preocupavam-se demais com a objetividade e ignoravam esse aspecto. Agora, nos novos experimentos parapsicológicos, espero usarmos cada vez mais objetos significativos na transferência telepática. E voce tem razão, a explicação completa tem de usar a palavra “telepatia”, tem de usar a transferência não-local de informações, neste caso, transferência não-local de informações significativas, arquetípicas. E esse é o motivo para os melhores resultados. Mas a não-localidade, a não-localidade quântica, tem de ser evocada para se ter uma explicação completa do que ocorreu. Obrigado.

Mario Cortella: Doutor Amit, eu juntei algumas questões nisso que eu não vou tratar delas como perguntas, porque eu acho que na sua obra, pelo menos no que eu pude ler, há um aprofundamento disso e uma leitura mais detalhada ofereceria mais questões. Por exemplo, no campo da psicanálise essa idéia de que o universo é quando é percebido e até interferido, será que não seria uma postura um pouco ego-narcísica da nossa parte, um pouco antropocêntrica em relação ao próprio universo que dificulta a idéia de um cosmo, invertendo Dostoievsky. Dostoievsky disse que se Deus não existe, tudo é permitido. Nessa compreensão, parece que se Deus existe, aí é que tudo é permitido, porque existe aí uma probabilidade que pode ser interferida. E uma outra questão, que eu acho que está na sua obra mas acho que vale aprofundamento, é o ateísmo metodológico, sendo que foi tão caro para a ciência para poder buscar explicações, mas ele não é mais necessário. Mais aí a questão de fundo: eu tenho lido, não sei se é verdade, que a Física Quântica mostra que hoje o tempo é uma ilusão. Alguns têm dito que não se fala mais em universo, mas em multiverso, porque haveria vários universos paralelos. Isso traria um problema: a possibilidade de viajar no tempo. A maior explicação que achei até hoje contra a viagem no tempo, foi do Físico inglês, Stephen Hawking, que usou um argumento lógico. Ele disse: “É impossível viajar no tempo porque se um dia for possível isso, os homens do futuro já teriam voltado”. Mas a Física Quântica ao falar em universos paralelos levanta a possibilidade de se ter o tempo como uma mera ilusão humana. Isso me coloca a seguinte pergunta aí para o senhor: será que nós chegaremos, com a Física Quântica, a voltar à origem do cosmos e, aí sim, encontrar o princípio explicativo?

Amit Goswami: Bem, suas duas colocações são muito boas, e a pergunta é extremamente fascinante. A primeira coisa que quero dizer é que ‘não dizemos que tudo é possível’ apenas por termos incluído aí a consciência em nossas teorias, porque ainda estamos concordando totalmente com a Física Quântica que a causalidade ascendente molda a forma das possibilidades, a partir da qual a consciência escolhe. Tanto a causalidade descendente, quanto a ascendente têm papel fundamental na nova Física, na nova Ciência. Essa é uma das virtudes que temos. A nova Ciência absorve a velha Ciência nos limites do princípio da correspondência, no limite de que poderíamos falar apenas em termos de probabilidades para um grande número de coisas e eventos. A velha Ciência não desaparece. Não poderia. É solidamente baseada em dados experimentais. A nova Ciência expande a velha Ciência em arenas com as quais a velha Ciência não pode lidar. Como eventos singulares de criação, criatividade. Esse é o primeiro ponto. Sobre voltar no tempo, há experimentos quânticos. O mais famoso é o experimento de Le Choice, mas é muito longo para explicar, e muito complicado para os espectadores realmente apreciarem. Embora, se alguém estiver interessado nele, há livros sobre ele. Leiam, por favor, é fascinante. Há algo acontecendo. Essa idéia de voltar no tempo é real na Física Quântica. Podemos ser afetados por coisas no futuro, assim como somos afetados por coisas no passado. Na Física Quântica, o tempo é não-linear. Isto posto, claro que experimentos recentes são tão impressionantes, tão surpreendentes, que muitos físicos convencionais, conservadores, procuram formas de viajar no tempo. Mas acho que o consenso é que a viagem no tempo envolve muito mais do que esta observação da Mecânica Quântica. Não podemos mais descartá-la, mas ela envolve muito mais pois ainda temos sérios problemas de como trazer os efeitos quânticos aos macrocorpos. Pois os efeitos quânticos são muito destacados apenas em objetos microscópicos, e não tão destacados em macro-objetos. A situação da medição é uma exceção. Mas normalmente descobrimos apenas raios ‘laser’, supercondutores, poucas coisas, poucos macro-objetos em que os efeitos quânticos persistem. Então temos de resolver esse problema de como macrocorpos podem ser transportados pelo tempo, e isso levará um tempo. Se a consciência voltar a essa equação, e ela precisa voltar, em algum ponto, então, outra dimensão de pensamento se abrirá e isso pode nos dar novas respostas, novas visões sobre isso. Mas é muito prematuro falar sobre isso, acho.

Rose Marie: Eu sou muito interessada em história da tecnologia, porque eu acho que através da tecnologia é que os sistemas econômicos se desenvolvem, que cresce uma dominação de potências hegemônicas. Isso vai muito na linha da pergunta do Cláudio Abramo. Eu sei que o senhor está trabalhando na construção do primeiro computador quântico. Eu quero perguntar uma coisa: o computador quântico dá saltos quânticos, ele cria? Qual a diferença dele do computador determinístico?

Amit Goswami: Essa é uma pergunta muito interessante. O que é um computador quântico? Um computador quântico em vez de usar um algoritmo específico, usa um algoritmo ambíguo. No computador quântico é usada a superposição de possibilidades e, dessa forma, espera-se que seja muito mais rápido que o computador convencional. Desde que o computador quântico opere apenas nesse nível, eu não espero que ele seja uma novidade tão grande, a não ser o fato de ele ser mais rápido. É isso que interessa aos cientistas da computação. Mas eu tenho um interesse diferente nesse computador. Se o computador for construído, por ter um processador quântico, por processar superpondo possibilidades...

Rose Marie: É tão realista.

Amit Goswami: Isso mesmo. Assim como o ser humano faz. O cérebro humano, de forma semelhante, processa de forma quântica as possibilidades, em vez de trabalhar diretamente, de maneira algoritmica, sem ambiguidade. Então, alguém pode fazer um computador que tenha todos os outros aspectos da medição quântica? A situação da medição quântica envolve um mecanismo que chamo de hierarquia embaraçada. É um pouco difícil de entender, mas um exemplo é a frase: “Eu sou mentiroso”. Se pensar nela, verá que a relação hierárquica entre sujeito e predicado é recíproca. “Eu” qualifica mentiroso, e vice-versa. Um qualifica o outro. É o que chamo de hierarquia embaraçada. A medição quântica no cérebro é assim. A questão intrigante para mim é que: suponha que no futuro encontremos um computador com hierarquia embaraçada. O interessante é que a hierarquia embaraçada dá margem à auto-referência. Então, este computador quântico terá auto-referência? A consciência cooperará na criação de um aparelho feito por humanos, que não seguiu uma evolução, mas desenvolvido pela inteligência humana? A consciência cooperará? A consciência cósmica cooperará e o tornará um ser consciente? Eu não sei a resposta. Mas esta será uma verificação fundamental, uma das mais fantásticas, das idéias que discutimos hoje. Acho que essa pesquisa deve ser encorajada. Obrigado pela pergunta.

Lia Diskin: Tentando fazer uma síntese dentro das idéias da biologia, dentro das idéias da psicologia e, logicamente, de toda a Física que o senhor coloca, o que hoje sabemos é que apenas 2% de nosso cérebro utiliza vias neuro-cerebrais para entrada e saída de informação. E é a partir disso, que nós construímos o que chamamos “os objetos ideais e universais” que constituem a ciência. 98% restante pertence a um universo interno, nebuloso, no qual existe a fantasia, a ilusão, logicamente a irracionalidade e também a probabilidade. Até que ponto podemos dizer que é possível um verdadeiro diálogo com essa disparidade de porcentagens? Até que ponto podemos dizer que é possível uma cientificação das idéias, de Deus, ou das idéias internas, humanas, divinizadas, como queira chamá-las?

Amit Goswami: Em outras palavras, deixe-me ver se entendi a pergunta, há muitas coisas que são fantasias e há muitas coisas que envolvem Deus. É possível transformar esses aspectos fantasiosos em científicos? É uma pergunta interessante. Claro, na criatividade, transformamos fantasias, transformamos algumas fantasias em algo científico. Porque algumas delas são fantasias criativas. Em outras palavras, a imaginação, a parte mental de nossas vidas, a parte interna de nossa vida, é fundamental no que fazemos no mundo externo. Na nova Ciência, por estarmos igualmente envolvidos com o mundo externo e o interno, pelo fato de a subjetividade ter voltado à ciência, estamos validando o conceito de que, talvez, devamos levar algumas de nossas fantasias a sério. Porque a idéia contrária também pode ser positiva, ou seja, de que tudo é uma fantasia. Fantasia da mente, fantasia da consciência. Porque a consciência é a base do ser, e o que pensávamos ser material e real, e o que pensávamos ser fantasia e irreal, esta distinção não é muito clara, agora. São todas possibilidades da consciência. Portanto, é a consciência que as valida, que escolhe entre elas, que lhes dá substancialidade. Então, qual delas será substancial depende totalmente da escolha, do contexto no qual a consciência as vê. Isso vai revolucionar a sociedade, como voce antecipou com sua pergunta. Em outras palavras, vamos levar nosso mundo interno muito mais a sério. Eu costumo dizer às pessoas que, se elas estudarem seus sonhos, o preconceito que costumamos ter é de que o sonho não é contínuo, portanto, de que adianta estudá-los? Há evidências de que os sonhos são contínuos, mas é preciso olhá-los sob o ponto de vista significativo. Alguns ficariam felizes com essa descoberta científica, de que os sonhos dão um relatório sobre a parte significativa das nossas vidas. Então, há outros aspectos da vida com os quais a ciência materialista não pode lidar e com os quais podemos lidar agora por colocar a consciência de volta, por exemplo, o pensamento. E, quando fazemos isso, nossa vida interna adquire uma enorme importância. Sim, a vida interna lida com o pensamento, a beleza, os arquétipos, de uma forma diferente que a vida externa, materialista, pode. E, focalizando na vida interna, não só podemos nos transformar, essa é a parte mística, mas também podemos ter enormes visões sobre o que criar, como criar, sobre nossas artes, sobre nossa música, até sobre a ciência.

Pierre Weil: Eu queria primeiro felicitar esse programa, Roda Viva, pelas iniciativas que está tomando. Eu quero dizer que é a primeira vez que eu vejo na televisão, problemas tratados no nível que merecem, na altitude que merecem, problemas como a parapsicologia, a psicologia transpessoal. Isso é feito graças a uma mudança de paradigma. E eu queria realçar de novo para o público telespectador que o que estamos tratando aqui tem uma influência muito grande sobre a destruição da vida no planeta e a grande crise de violência que está assolando atualmente o mundo, não é só o Brasil. Eu queria, já que estamos no fim do programa, deixar a oportunidade a Amit Goswami, que nós convidamos na nossa Universidade da Paz em Brasília, justamente porque ele representa um novo paradigma, como que o antigo paradigma é responsável pela violência atual do mundo, antiga visão que está responsável pela destruição da vida no planeta, e como o novo paradigma pode nos ajudar a nos tirar dessa crise, além de medidas policiais e de mudança de lei que são necessárias, mas são absolutamente insuficientes?

Amit Goswami: Obrigado. Acho muito importante dizer que, sem reconhecer a consciência e sem reconhecer o valor da nossa vida interna, sem reconhecer o valor da transformação, nunca mudaremos a violência na sociedade. Então, é muito importante ver que apenas pensando em não-violência, apenas falando dela, não deixaremos a violência. É preciso passar por todo o processo criativo. A nova Ciência, o novo paradigma, é extremamente importante porque sempre enfatiza a criatividade. Na velha Ciência, o determinismo e behaviorismo, essa idéia de que o condicionamento prevalece, nos cegou tanto quanto à transformação, nos cegou tanto que desistimos. Basicamente, os valores não eram necessários. Steve Weinberg disse que não há significado no universo, não há valores se o consenso é o julgamento dos cientistas materialistas, e isso ocorre dentro da sociedade, e o behaviorismo diz: “Não podemos fazer nada. Somos seres comportamentais, somos condicionados”. E a nova Ciência diz: “Não. Também há forças criativas dentro de nós. Basta aprender a agir a partir desse estado de consciência não-ordinário no qual voce tem escolhas”. E o meu novo lema, em vez do cartesiano “eu penso, logo existo”, e pensamento é uma condição behaviorista, meu novo lema é: “escolho, logo existo”. Se é “escolho, logo existo”, posso escolher a não-violência. Mas tenho de aprender como escolher, e isso exige criatividade. Essa é, realmente... a nova confiança do novo paradigma: em vez de escolher a metade condicionada do mundo, vamos dividir o mundo em condicionamento e criatividade. Forças do Bem e do Mal, das quais falamos antes. Podemos ser muito otimistas. Se essa mudança para o novo paradigma vier logo, talvez possamos realmente lidar com a violência de uma forma realmente prática, em vez de apenas verbalmente, como fazemos.

Carlos Ziller: Quando eu estava fazendo a minha leitura dos seus trabalhos, percebi um sentimento que eu compartilho, de um incômodo profundo com relação a algumas conclusões que emergem de determinados meios científicos. Vou dar só um exemplo, acho que o telespectador vai se lembrar, certamente. Há algum tempo atrás apareceu um resultado de um laboratório do EUA que falava da descoberta do gene da homossexualidade. Mais recentemente falou-se no gene da obesidade, e há toda uma série de conclusões desse tipo que não deixam de produzir, nos homens de bom senso, uma certa surpresa, e, contudo, mesmo em homens que são materialistas e bem convencidos, que não aceitam, rejeitam esse determinismo radical que emerge de alguns ambientes científicos, sobretudo norte-americanos. Há um materialismo que convive muito bem com o livre-arbítrio. Há um realismo filosófico que convive muito bem, sem muito inconveniente, com paradoxos, com contradições. Isso não é, digamos, o todo, do que se poderia chamar de “atividade científica”. Por fim, eu gostaria de fazer uma pergunta, e é a questão mais importante que eu teria a colocar, que emerge também de uma sensação que eu tive ao ler “O universo auto-consciente”. Eu tive a sensação de retornar ao passado, aí sim uma viagem ao passado. Eu vi ali, arrumados, organizados de uma forma muito particular por voce, idéias e proposições que eu já havia conhecido em leituras, por exemplo, da obra do cardeal Nicolau de Cusa , grande pensador do século XV, que propôs que o universo era resultado de uma contração de Deus, e essa contração, enfim, não é o caso aqui de eu explanar essa filosofia. Mas esse tipo de pensamento, produziu, interagiu com concepções científicas do século XVI, do século XVII, com concepções que propunham que a divindade organizasse, ou enfim, propunha uma visão bastante parecida com essa, um projeto científico bastante parecido com esse que voce está propondo nesse seu livro. A humanidade passou por um processo muito longo, muito duro, para conseguir, digamos, não eliminar Deus da Ciência, mas pelo menos reduzir um pouco seu papel, esse processo foi longo e lento. Para concluir, como o senhor acredita poder convencer os cientistas desse seu projeto, depois de tanto esforço para conseguir criar uma noção de objetividade, de realidade, de realismo, com todos os exageros em alguns momentos, mas convencer esses homens depois de tanto esforço? O senhor imagina conseguir isso usando que gênero de recursos?

Amit Goswami: Eu acredito que as idéias se verificarão por si mesmas, serão confirmadas nos laboratórios e serão úteis. A ciência tem dois critérios fundamentais. Por isso Galileu é chamado de pai da ciência moderna, pois ele enunciou claramente esses dois critérios. Um é que a ciência deve ser verificável. Ela deve ser verificada experimentalmente. E a segunda idéia é que a ciência deve ser útil. No aspecto da verificação, já apresentei alguns experimentos a voces, pois o tempo é curto, não entrarei em outros experimentos, mas digo que há um número enorme de experimentos sendo realizados, graças à Parapsicologia e interessados em Parapsicologia. Mas também em Biologia, e a Medicina é uma grande área de verificação experimental de algumas de nossas idéias. Mas a questão da utilidade é a mais importante. Deepak Chopra ficou famoso por um livro que escreveu, chamado Cura Quântica, lançado há 10 anos. Ele começou a revolucionar a Medicina, de certa forma, pois há um fenômeno chamado “efeito placebo” para o qual os cientistas não têm explicação. E esse trabalho, que é muito semelhante à minha forma de pensar, e eu tenho lido trabalhos citando a conexão entre as nossas idéias... Mas veja as implicações disso. Se, de fato, houver cura quântica, se houver Medicina mental, o efeito da mente sobre a cura, então as pessoas serão de fato ajudadas, não apenas no campo da Psicologia, mas no campo da verdadeira saúde física. A saúde física real, que importa para muito mais pessoas do que a saúde mental, ainda não estamos esclarecidos o bastante para levar a saúde mental tão a sério. Mas todos se preocupam com a saúde física, levam muito a sério. É a aplicação da nova Ciência a essas áreas, especialmente na área da saúde, que vai trazer a revolução de que Deus é importante, a consciência é importante, a criatividade é importante, observar o livre-arbítrio e responsabilidade é importante, que temos um paradigma científico que pode unir todas essas coisas, trazê-las para junto da velha ciência e ter formas objetivas de proceder e prever. Será uma ciência previsível, poderá ser verificada e também será útil. Isso é o que mudará a percepção do público. A percepção dos cientistas, também. Obrigado.

Heródoto Barbeiro: Doutor Goswami, muito obrigado por vir.

Amit Goswami: Muito obrigado. Foi um prazer estar aqui.